ARTIGOS ORIGINAIS

 

 

Vivencias de portadores de HIV/AIDS sob a perspectiva da promoção da saúde

 

 

Agnes Caroline Souza Pinto1, Maria Luciana Teles Fiuza1, Patrícia Neyva da Costa Pinheiro1, Neiva Francenely Cunha Vieira1, Marli Teresinha Gimeniz Galvão1
 
1Universidade Federal do Ceará

 


RESUMO
Objetivo: Conhecer as vivências de portadores do HIV/Aids que frequentam grupo de autoajuda fundamentado na Promoção da Saúde. Método: Estudo descritivo, de caráter retrospectivo, utilizando análise qualitativa. Os dados foram coletados, e posteriormente analisados, nos registros do grupo de autoajuda para pacientes soropositivos no ambulatório especializado em doenças infecciosas de Fortaleza, CE, Brasil, entre fevereiro e outubro de 2010. Resultados: Os resultados foram categorizados em: (1) Conhecimento: onde existe a incorporação de novo conceito sobre fato ou fenômeno; (2) Motivação: está ligada a atributos pessoais que modificam o desejo dos sujeitos; (3) Adesão: implica em um processo colaborativo onde há participação do sujeito nas decisões de sua terapêutica; e (4) Mudança de Comportamento: está associada a condições positivas ou negativas na vida do sujeito. Conclusão: As ações educativas desenvolvidas nos atendimentos grupais possuem grande importância no processo de ensino e aprendizagem para a criação e transformação dos sujeitos inseridos nesse contexto.
Palavras-chave: Síndrome da Imunodeficiência Adquirida; Promoção da saúde; Educação em saúde; Processos Grupais.


 

INTRODUÇÃO

O quadro referente à Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) e o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), com o avanço e a disponibilidade dos tratamentos e cuidados oferecidos, como os antirretrovirais (ARV), tem sofrido mudanças quanto ao perfil de mortalidade e morbidade relacionadas à doença. Atualmente, as pessoas com diagnóstico soropositivo ou em tratamento têm apresentado um acréscimo na sobrevida(1).

Entretanto, é necessário assegurar nos processos terapêuticos ações de promoção da saúde que fortaleçam as mudanças no estilo de vida dos portadores do HIV ou naqueles em fase de tratamento. Para o portador do HIV, ainda, a descoberta do diagnóstico é um choque e acarreta traumas de natureza física, emocional e social(2).

A Aids por se caracterizar hoje como uma doença crônica, requer que o profissional de saúde promova junto às pessoas que vivem com esta doença oportunidades que os ajudem a enfrentar os problemas de saúde relacionados a outros aspectos da sua qualidade de vida, a partir da sua personalidade e do contexto social e familiar ao qual está inserido(2).

Os portadores do HIV enfrentam diversas situações que afetam o seu estilo de vida e, por extensão, a forma como irão lidar com a enfermidade. Aprendendo e compartilhando mais sobre a patologia, os portadores do HIV terão subsídios para realizar ações de autocuidado com autonomia e que possibilitarão uma melhor qualidade de vida.

As vivências grupais constituem estratégias nas quais os participantes podem compartilhar conhecimentos, experiências, expectativas e sentimentos que venham a favorecer a decisão nas mudanças de comportamento de saúde. No desenvolvimento de tais vivências, podem se desenvolver o grupo terapêutico e o grupo educativo.

O grupo terapêutico caracteriza-se pela ênfase nos processos de autoajuda, como um método de trabalho para promover crescimento pessoal, desenvolvimento e aperfeiçoamento da inter-relação das redes de apoio dos participantes, utilizando um processo experimental. Neste, os participantes desenvolvem e aprimoram sentimentos de confiança, construindo laços de simpatia e calor humano com os outros membros do grupo com a finalidade do conhecer a si mesmos e aos outros de forma mais completa, gerando melhorias sociais e proporcionando ajuda mútua(3).

Nos grupos educativos, as ações desenvolvidas visam à modificação dos hábitos e comportamentos por meio da problematização e reflexão dos problemas de saúde que afetam as pessoas nos grupos, favorecendo a socialização, reciprocidade e confiança entre eles e os profissionais de saúde e, em um sentido mais amplo, promovendo a saúde(4).

A interface entre as vivências grupais repousa na sua finalidade em proporcionar atividades dirigidas à mudança de comportamento dos indivíduos, com foco em seus estilos de vida, localizando-os no seio das famílias e no ambiente cultural da comunidade em que se encontram.

Ambas baseiam-se no entendimento de que a saúde é produto de vários fatores relacionados com a qualidade de vida, incluindo um padrão adequado de alimentação e nutrição; habitação e saneamento; boas condições de trabalho; oportunidades de educação ao longo de toda a vida; ambiente físico limpo; apoio social para famílias e indivíduos; estilo de vida responsável; e um espectro adequado de cuidados de saúde(5).

Outro aspecto favorecido nestas vivências são as estratégias de empoderamento e autonomia, que constituem ferramentas de grande importância para a promoção da saúde. Estas, além de motivar o indivíduo à legitimação e possibilitar a expressão de grupos marginalizados, também promove a ruptura de barreiras que são causadoras de limitação na produção de uma vida saudável. Assim, para essa construção, é importante a intervenção do profissional enfermeiro, que pode oferecer o conhecimento para a aquisição de novos comportamentos(6).

É nesse contexto que se situa a pessoa portadora do HIV, face à readaptação do estilo de vida, o que requer um complexo processo de cuidados. O aprendizado do paciente é inerente ao processo e necessário para que o mesmo tenha a possibilidade de escolha dentro de seu contexto de saúde-doença(3,7).

Dessa forma, este estudo apresenta relatos de vivências grupais de pacientes portadores do HIV, dentre os quais se destacam aqueles que possuem um enfoque educativo. A educação em saúde parte da compreensão de que as mudanças de comportamento ocorrem quando os participantes passam a possuir uma visão crítica e embasada na realidade, com permanentes trocas de informações em relação à formação de condutas, visando à adoção de hábitos saudáveis para alcançar uma melhor qualidade de vida(7.

Desse modo, este estudo com pacientes portadores do HIV participantes do grupo de autoajuda teve a finalidade de conhecer os processos terapêuticos que valorizam a educação em saúde em ambientes hospitalares, com enfoque no autocuidado.

 

MÉTODO

Pesquisa documental e descritiva, de caráter retrospectivo, utilizando análise qualitativa, uma vez que esta abordagem possibilita expressar o sentido dos fenômenos do mundo social entre teoria e dados(8).

A pesquisa documental possui como característica a utilização de fonte de coleta de dados restrita a documentos, escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias. Estas podem ser geradas no momento do acontecimento do fato ou fenômeno, ou posteriormente(8).

Os dados desta pesquisa são procedentes dos registros dos formulários preenchidos pelos facilitadores após as atividades grupais realizadas com pacientes portadores do HIV, no período de fevereiro a outubro de 2010, no ambulatório especializado em doenças infecciosas do Hospital Universitário Walter Cantídio, da Universidade Federal do Ceará (HUWC), em Fortaleza, CE. O grupo de autoajuda teve início em 2006 e constituía uma das atividades desenvolvidas pelo projeto “Núcleo de Estudos em HIV/Aids e Doenças Associadas” (NEAIDS), que objetiva promover a educação em saúde no contexto da infecção pelo HIV. Esse grupo, além de contribuir para a promoção da saúde dos infectados e prevenção de outros agravos, também constitui um espaço formador de profissionais de saúde, propiciando assim a produção de conhecimento.

No serviço, o grupo de autoajuda era de livre acesso, semanal, e ocorria em ambiente apropriado com duração média de uma hora. O convite para participação da atividade grupal era extensivo para todos os pacientes. Aquele que almejava participar da atividade, após a confirmação da presença no atendimento clínico, dirigia-se espontaneamente para o local. O grupo era mediado por uma equipe de enfermagem. O enfermeiro era o mediador dos assuntos levantados pelo grupo, e um acadêmico de enfermagem anotava atentamente os conteúdos revelados pelos integrantes. Utilizava-se para registro dos dados um impresso próprio, no qual eram tomadas notas das seguintes variáveis: sexo, idade, falas, depoimentos emitidos pelos participantes e os temas debatidos durante o desenvolvimento grupal. As falas, os depoimentos e os conteúdos temáticos originaram-se de 33 atendimentos grupais, nos quais participaram 53 pacientes, sendo que, em cada sessão, eram atendidos de dois a seis pacientes.

Os depoimentos e falas de cada um dos participantes foram tratados individualmente; os relatórios grupais, revisados, lidos e relidos para garantir a veracidade dos dados.

Para a análise dos conteúdos desenvolvidos nos atendimentos grupais, utilizou-se a técnica de análise de conteúdo, a qual aborda materiais textuais escritos, ou seja, com a materialidade linguística através das condições empíricas do texto, esperando assim compreender o pensamento do sujeito através do conteúdo expresso no texto, numa concepção transparente de linguagem e estabelecendo categorias para sua interpretação(9). Esta técnica de análise compõe-se de três grandes etapas: 1) a pré-análise: fase de organização, em que se utilizaram vários procedimentos, tais como leitura flutuante, hipóteses e objetivos; 2) a exploração do material, através do qual os dados são codificados a partir das unidades de registro; e 3) o tratamento dos resultados e interpretação, através dos quais se fez a categorização, que consiste na classificação dos elementos segundo suas semelhanças e por diferenciação, com posterior reagrupamento, em função de características comuns. Dessa forma, surgiram as seguintes categorias: Conhecimento; Motivação; Adesão; e Mudança de Comportamento.

É importante destacar que esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Ceará, sob protocolo n° 249/09, seguindo as normas do Conselho Nacional de Saúde, que regulamentam a pesquisa em seres humanos, resolução n° 196, de 10 de outubro de 1996(10). Para preservar a identidade dos participantes, estes foram identificados por letras atribuídas aleatoriamente.

 

RESULTADOS

O conhecimento dos processos terapêuticos desenvolvidos nas sessões grupais foi agrupado por meio de categorias que, por sua vez, podem estar associadas ou não com a finalidade de facilitar a compreensão das estratégias de educação em saúde desenvolvidas pelo grupo de autoajuda em um serviço de assistência especializada.

Conhecimento

Conhecer é incorporar um conceito novo ou original sobre um fato ou fenômeno qualquer. O conhecimento não nasce do vazio, mas das experiências acumuladas durante a vida, através dos relacionamentos interpessoais e das leituras de livros e artigos diversos(6).

O fornecimento de informação e/ou avaliação das experiências vivenciadas não são garantia de aprendizagem do indivíduo(6), já que o conhecimento fornecido nas sessões grupais deve ser testado através das vivências desenvolvidas.

No caso de pacientes soropositivos, observou-se o medo e a não aceitação do diagnóstico positivo, porém com o conhecimento sobre a doença, os indivíduos afirmaram melhoria em seu cotidiano.

Estou aceitando melhor o meu problema, tenho que continuar... agora que eu sei como me tratar... Au

Descobri o HIV na gestação, meu filho é saudável e meu marido HIV negativo, agora sei como conviver com a sorodiscordância, e procuro ter hábitos de vida saudáveis... Ao

Está sendo muito difícil, mas já procurei me informar bem sobre o tema para ficar mais calmo. Isso me ajudou muito. Cl

 Uma forma de aquisição de conhecimento pelos sujeitos ocorre através das informações apresentadas pelos meios de comunicação em massa que, se bem aproveitadas, podem gerar entendimento entre a população sobre o problema de saúde que a acomete.

Acompanho nos jornais as descobertas sobre a nossa luta contra DSTs e a Aids... Ds

Me informo bastante pela internet, minhas dúvidas no início eram muito primárias. Rn

Essas falas demonstraram o interesse dos indivíduos em aprender mais sobre a doença, a qual reconhecem desconhecer, e a motivação para a busca de informações sobre a doença como uma forma de perceber a disparidade entre o estado de saúde atual e o esperado, visando sempre a um comportamento de saúde mais saudável.
O conhecimento pode gerar reflexão e ação mais voltada para o desenvolvimento da melhoria da qualidade de vida desses pacientes.

Motivação

Palavra advinda do latim movere, significa começar um movimento. Tem sido definida também como uma força psicológica que “move” uma pessoa a realizar algum tipo de ação. Também descrita como a vontade do aprendiz de se envolver na aprendizagem, a prontidão, então, é uma evidência da motivação(11).
Este discurso ressaltou o desejo de viver e a prontidão em adiar a morte:

Todos podem morrer. Eu não quero morrer agora. Jc

Em relação às influências ambientais, destaca-se o fato de que o ambiente pode criar promover ou diminuir o estado de receptividade à aprendizagem. Um ambiente prazeroso, confortável e adaptado pode alterar o estado de prontidão para aprender(11). O ambiente do sistema de saúde ou, no caso deste estudo, referente a um grupo de autoajuda, influencia o compromisso do cliente com este e afeta a sua vontade de aderir a comportamentos que promovem a saúde, como observado nas falas a seguir:

Eu estou gostando muito do grupo. Ele está me ajudando no tratamento da minha depressão e já fiz alguns amigos. Ar

O grupo é muito bom e eu tenho pena dos que não participam. Cr

Nesse cenário, pôde ser observada a motivação dos usuários em relação à participação no grupo e como eles avaliaram o modo com que este tem os ajudado no enfrentamento da doença.
E, por último, há as redes de relacionamento para a construção da aprendizagem, que são representadas pelos entes queridos, família, comunidade e interação profissional-paciente.

Não tenho do que reclamar a minha vida é boa, sou feliz e amo minha família, pois eles me dão força. Is

Eu vivo muito bem e meus filhos me apoiam em tudo que faço. Nd

Neste estudo, somente a família foi destacada dentro da rede de relacionamento, motivando esses indivíduos a enfrentarem a doença de maneira feliz. Por outro lado, os amigos foram citados como símbolo de abandono:

Antes do diagnóstico, eu tinha um ciclo de amizades muito grande, agora, meus amigos sumiram. Je

Na relação profissional x paciente, não foi demonstrada pelos sujeitos a crença no profissional da saúde como promotor isolado de mudanças e de atividades educativas, nem como detentor de conhecimentos acima do grupo.

Adesão

Adesão é um processo colaborativo que facilita a aceitação e a integração de determinado regime terapêutico no cotidiano das pessoas em tratamento, pressupondo sua participação nas decisões sobre o mesmo(1). Assim, a busca pela adequada utilização do ARV é o principal foco para que as pessoas portadoras do HIV possam usufruir dos benefícios que a utilização sistemática do tratamento pode acarretar.

Nesse processo, observaram-se as seguintes falas:

Tomo medicação desde 2004, ano do meu diagnóstico, nunca deixo de tomar as medicações. Sm

Tomo remédio direito, um pela manhã e outro a noite. Md

Para que o ARV seja utilizado corretamente e incorporado à rotina diária dos pacientes soropositivos, se faz necessário o incentivo à adesão ao tratamento, já que os regimes terapêuticos são complexos. Dentre as dificuldades, estão as grandes doses diárias de medicamentos e a necessidade de armazenamento destes em baixa temperatura; o tamanho grande dos medicamentos, dificultando a deglutição; além do conflito gerado pelos horários das doses no cotidiano dos pacientes.

Nesse contexto, as pessoas têm o direito de tomar suas próprias decisões a respeito do plano de ação em saúde desenvolvido pelo profissional que as atende. Essa atitude sistemática e decisória foi representada pelas falas a seguir:

Sou muito rigoroso com o horário da tomada da medicação. Pd

Tomo o remédio regularmente e só deixo de tomar quando falta e é difícil. Nd

No caso da utilização da medicação antirretroviral, existem vários fatores que influenciam a não adesão, termo que descreve a resistência do cliente em acolher a proposta terapêutica determinada para seu tratamento(11). Dentre estes, estão os efeitos colaterais produzidos pela ingestão das medicações, como expresso nos depoimentos:

No início do uso da medicação sentia muita dor de cabeça, perdi peso e febre constantemente. Pd

Iniciei os remédios há 30 dias, senti tontura e mal-estar, mas agora estou me adaptando às medicações. Rr

O coquetel deu inúmeras reações. Ar

A adesão total e em todos os momentos é uma proposta não alcançável, pois, em algumas situações, o comportamento de não adesão é desejado pelo indivíduo e funciona como uma forma de defesa ante as situações estressantes. Assim, o cliente pode ausentar-se da rotina estabelecida de tratamento para manter ou aumentar a intensidade da situação de aprendizagem, o que pode ser benéfico no seu retorno ao programa de tratamento(11).
Nesse sentido, o sucesso deste programa educativo resultou não só em uma adesão satisfatória e acerto no tratamento proposto, mas também em ação motivacional que originou o compromisso ou aceitação para obtenção de regimes de promoção da sua saúde.

Agora, depois do grupo, eu tomo o remédio como se fosse água. Nd

Mudança de Comportamento

As mudanças de comportamento demonstram que a manutenção ou não deste pode estar associada às consequências positivas ou negativas para a vida das pessoas. Neste sentido, as mudanças no cotidiano ou estilo de vida, em função do diagnóstico de Aids, irão requerer do paciente a adoção de novos comportamentos e abandono de outros, na tentativa de manutenção da sua qualidade de vida(12).

Para tanto, é necessário adotar um estilo de vida mais saudável, adequado e natural, com o intuito de isolar a doença(6).
Tais mudanças de hábito foram observadas nas seguintes falas:

Depois do diagnóstico, parei de beber. Ed

Eu bebia muito, mas agora, depois que descobri, não bebo mais. Cr

Parei de beber e estou bem com minha mulher ... estou bem Graças a Deus. Es

Além da cessação da utilização do álcool, verificaram-se também relatos enfatizando a preocupação com a alimentação e o exercício físico:

A minha alimentação é boa e sempre que posso faço uma caminhada. Is

Possuo uma alimentação equilibrada e isso me ajuda muito.  Rc.

Outro aspecto relacionado à saúde que merece atenção é o uso do preservativo, citado apenas por três integrantes:

Possuo hábitos de vida saudáveis e agora uso preservativo em todas as relações. Ao

Tenho me preocupado com minha vida em relação à alimentação, bebida e uso de preservativo, assim estou recuperando peso. Ma

Nunca fui de alimentar direito, mas uso camisinha em todos meus relacionamentos. Gd

Isso remete à reflexão sobre a importância da utilização de medidas educacionais que incentivem a adoção do uso do preservativo, um dos pontos destacados em todos os contatos com os profissionais de saúde, por constituir a principal ferramenta de luta contra a transmissão sexual da Aids. É preconizado que todos os portadores, tanto os sorodiscordantes quanto os soroconcordantes, devem fazer uso do preservativo, uma vez que o não uso com parceiro soropositivo dificulta o controle da carga viral do portador e facilita o risco de contaminação por vírus resistentes aos ARV(1). É interessante observar que o fato de reconhecer-se portador do HIV não implica no abandono do uso de preservativo, mesmo com parceiro não portador ou de sorologia desconhecida(13).

 

DISCUSSÃO

A educação em saúde apropria-se de referenciais teóricos que transpõem a noção determinística do saber instituído e da prática em saúde(6). São esses referenciais compreendidos que nortearam o desenvolvimento da discussão dos resultados. Quando avaliamos as categorias na educação em saúde, observamos não só a importância das histórias de vida, das crenças adquiridas e dos valores sociais desenvolvidos, mas também a importância da própria subjetividade dos sujeitos que integra este acúmulo de experiências que constituem o conhecimento(6). A intervenção educacional em saúde deve lançar mão desses conhecimentos pré-estabelecidos pelos indivíduos, na busca de adoção de novos comportamentos por meio de estratégias coletivas, visando à busca da autonomia individual através do empoderamento.

A motivação é o resultado de fatores intrínsecos e extrínsecos, os quais podem facilitar ou bloquear a motivação para aprendizagem. Esses fatores podem ser classificados nas seguintes categorias principais, que não são mutuamente excludentes: atributos pessoais; influências ambientais; e redes de relacionamento do aprendiz(11).
A adesão à terapia medicamentosa é extremamente importante para o sucesso do tratamento dos pacientes, principalmente no caso do ARV, pois objetiva a redução da morbimortalidade e melhora a qualidade de vida das pessoas, atuando na replicação viral, o que retarda ou evita o surgimento da imunodeficiência. O tratamento reduz progressivamente a carga viral e a manutenção e/ou restauração do funcionamento do sistema imunológico(1).

Observou-se que o desenvolvimento da atividade grupal entre os clientes portadores do HIV promove troca de experiências individuais que representam um poderoso meio educativo, em que acontece troca de soluções entre os membros do grupo que, potencializados pelo facilitador, irão gerar adesão às terapias medicamentosas e comportamentais necessárias.

As mudanças positivas provocadas nos participantes do grupo provavelmente não foram resultado somente do atendimento prestado, mas também da presença desses no grupo de pacientes, o que constitui uma oportunidade de serem escutados. Daí, ao mesmo tempo em que podem contribuir com os outros a partir de suas experiências pessoais, podem ser ajudados a entender melhor sua doença, gerando sentimentos como a compreensão, que os ajuda a desenvolver um conjunto de atitudes promotoras de crescimento, ou terapêuticas, em relação a si mesmos. Assim, a mudança de comportamento foi evidenciada como algo positivo e importante para a melhoria da qualidade de vida dos pacientes.

 

CONCLUSÃO

Neste estudo, verificou-se que a utilização da estratégia do grupo de autoajuda favorece a educação em saúde dos portadores do HIV e, consequentemente, favorece a melhoria da qualidade de vida destes, visto que o compartilhamento de experiências vividas pelos membros do grupo desenvolve o autoconhecimento e gera ferramentas importantes para a promoção da saúde.

As ações educativas desenvolvidas nos atendimentos grupais possuem grande importância no processo de ensino e aprendizagem para a criação e transformação dos sujeitos inseridos nesse contexto. Para tal, é necessária a participação espontânea, a autonomia e a valorização dos saberes individuais dos participantes.

A educação em saúde desenvolvida nas sessões grupais visava à motivação dos sujeitos, à adesão às terapias preconizadas e à mudança de comportamento, bem como à instituição do conhecimento com a intenção de promover ações emancipatórias e libertárias para o autocuidado. Portanto, pode-se dizer que estes objetivos foram alcançados, uma vez que, os discursos dos sujeitos demonstraram que as categorias de educação em saúde identificadas proporcionaram mudanças de práticas e ressignificaram suas tomadas de decisões.

 

REFERÊNCIAS

1. Ministério da Saúde (BR). Manual de adesão ao tratamento para pessoas vivendo com HIV e Aids. Brasília (DF): Secretaria de Vigilância em Saúde; 2008.
2. Carvalho CML, Galvão MTG.Enfrentamento da AIDS entre mulheres infectadas em Fortaleza – CE.  Rev Esc Enferm USP. 2008; 42(1):90-7.
3. Dall’agnol CM, Resta DG, Zanatta E, Schrank G, Maffacciolli R. O trabalho com grupos como instância de aprendizagem em saúde. Rev Gaúcha Enferm. 2007; 28(1):21-6. 
4. Rocha LP, Vaz MRC, Cardoso LS, Ameida MCV. Processos grupais na estratégia saúde da família: um estudo a partir da percepção das enfermeiras. Rev Enferm UERJ. 2010; 18(2):210-5.
5. Buss PM, Carvalho AI. Desenvolvimento da promoção da saúde no Brasil nos últimos vinte anos (1988 – 2008). Ciênc Saúde Coletiva. 2009; 14(6): 2305-16.
6. Kitchie S. Determinantes da Aprendizagem. In: Bastable SB. O enfermeiro como educador. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2010. p. 115-67.
7. Souto BGA. Souto BGA.  Reflexões psicossociais em torno da pessoa infectada pelo HIV. Rev Soc Bra Clin Med. 2008; 6(3):115-22.
8. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 11ª ed. São Paulo: Hucitec; 2008.
9. Bauer MW. Análise de conteúdo clássica: uma revisão. In: Bauer MW, Gaskell G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som: um manual prático. 3ª ed. Petrópolis (RJ): Vozes; 2002. p.189-217.
10. Conselho Nacional de Saúde (BR). Resolução nº 196, de 10 de outubro de 1996. Aprova diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Diário Oficial da União 16 Out 1996; Seção 1.
11. Richards E, Digger K. Adesão, Motivação e comportamentos de saúde do aprendiz. In: Bastable SB. O enfermeiro como educador. 3ª ed. Porto Alegre: Artmed; 2010. p. 221-47.
12. Cardoso AL, Marcon SS, Waidmani MAP. O impacto da descoberta da sorologia positiva do portador de HIV/AIDS e sua família. Rev Enferm UERJ. 2008; 16(3):326-32.
13. Barroso LMM, Pereira KC, Almeida PC, Galvão MTG. Compliance with antiretroviral treatment among patients with AIDS - a descriptive study. Online braz j nurs [ serial in the internet ]. 2006 [ cited 2011 July 19 ] 5(2). Available from: http://www.objnursing.uff.br/index.php/nursing/article/view/290

 

Recebido: 17/10/2011
Aprovado: 06/08/2012