ARTIGOS ORIGINAIS

 

Terapia infusional e remoção não eletiva do cateter epicutâneo: coorte de neonatos


Priscila Costa1, Maurina Nunes da Silva1, Amélia Fumiko Kimura1

1Universidade de São Paulo

 


RESUMO
Objetivo: verificar a associação entre a terapia infusional e a incidência de remoção não eletiva em cateteres epicutâneos de silicone e via única, instalados em recém-nascidos.
Método: estudo de coorte prospectiva, realizado em unidade de terapia intensiva neonatal de um hospital privado de grande porte da cidade de São Paulo. A amostra foi composta por 97 cateteres epicutâneos, sendo 15 deles indicados para terapia infusional exclusiva e 82 indicados para terapia infusional múltipla.
Resultados: a incidência de remoção não eletiva foi de 26,7% nos cateteres como terapia infusional exclusiva e 36,5% nos cateteres com terapia infusional múltipla, sem diferença estatisticamente significativa (p=0,33). Complicações como edema do membro e extravasamento ocorreram apenas entre cateteres com terapia infusional múltipla.
Conclusão: recomenda-se a adoção de estratégias para prevenção, detecção precoce e tratamento imediato das complicações que resultam em remoção não eletiva do cateter epicutâneo independente do tipo de terapia infusional.
Descritores: Cateterismo venoso central; Cuidados críticos; Recém-Nascido; Enfermagem neonatal.


 

INTRODUÇÃO

A garantia de acesso venoso seguro em neonatos é um desafio constante na rotina da equipe de enfermagem. O enfermeiro deve selecionar o dispositivo vascular que melhor corresponda à terapêutica intravenosa prescrita e sua duração prevista, integridade da rede vascular do indivíduo, habilidade do profissional e recursos disponíveis para o cuidado do dispositivo(1).

O cateter central de inserção periférica (CCIP) ou cateter epicutâneo é uma das opções de acesso vascular na população neonatal, pois se trata de um dispositivo vascular central não tunelizado inserido à beira do leito com técnica asséptica, através de uma veia periférica do membro superior ou inferior(2). Esses cateteres são indicados para a infusão de soluções endovenosas intermitentes ou contínuas de curto ou longo prazo como antineoplásicos, medicações de características vesicantes ou irritantes, nutrição parenteral e uma variedade de antibióticos, além de outras drogas com pH inferior a 5 ou superior a 9, bem como soluções com osmolaridade superior a 600 mOsm/L(1,3).

O Conselho Federal de Enfermagem brasileiro e o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo consideram a inserção, manutenção e remoção do CCIP como de competência privativa do enfermeiro com qualificação específica, competência científica e conhecimento à respeito das normas regulamentadoras e dos princípios éticos para uma prática segura(4,5).

O CCIP utilizado na população neonatal tem diâmetro de 1.1 a 3.0 French (Fr), sendo produzido em material biocompatível como silicone e poliuretano de uma ou duas vias, podendo conter válvula antirrefluxo ou não em sua extremidade distal(1,2). O cateter epicutâneo de lúmen único está indicado para a infusão exclusiva de um tipo de terapia infusional, a exemplo da nutrição parenteral ou de antibióticos. Já o cateter de duas vias é indicado para neonatos que recebam múltiplas infusões concomitantes(2), como por exemplo soro e drogas vasoativas. No entanto, o cateter de duas vias ainda representa uma tecnologia recente com uso em expansão no cenário clínico, por isso sua disponibilidade nos serviços de saúde ainda é limitada.

Estudos demonstram que o cateter epicutâneo de uso predominante na população neonatal é o confeccionado em silicone de via única e calibre de 1.9 Fr(6). Trata-se de um cateter introduzido na unidade de terapia intensiva neonatal (UTIN) brasileira desde a década de 1990(7). Uma vez que nem sempre é possível adequar o tipo de cateter à terapia infusional prescrita, é comum utilizar o CCIP de único lúmen para a infusão de múltiplas soluções. No entanto, o tipo de terapia infusional pode influenciar na ocorrência de complicações que levam à remoção não eletiva do cateter,(2).

As complicações mais comuns que levam à remoção não eletiva do CCIP em neonatos e crianças incluem as mecânicas como obstrução, tração acidental, ruptura e vazamento do cateter, bem como as complicações infecciosas, flebite e trombose(8). Um estudo de coorte realizado em uma UTIN de São Paulo analisou 270 CCIP e relatou uma incidência de remoção não eletiva de 35,4% e uma taxa de incidência de 34,8/1000 cateter-dia, entre os cateteres de silicone de 1.9 Fr, e as complicações mais frequentes foram ruptura externa e obstrução(9). A obstrução pode ter origem trombótica e não trombótica. As obstruções não trombóticas são causadas pela precipitação de drogas incompatíveis e infusões múltiplas através do lúmen do cateter, e as trombóticas pela formação de coágulos,(8).

A assistência de enfermagem tem um papel crucial na prevenção de complicações relacionadas ao uso do CCIP em neonatos. A literatura sugere que o tipo de terapia infusional pode estar associado à ocorrência de complicações no cateter epicutâneo, conforme resultados de uma pesquisa que avaliou 67 recém-nascidos submetidos a 84 instalações do CCIP monolúmen de silicone e duplo lúmen de poliuretano. Esta pesquisa mostrou que entre os cateteres removidos não eletivamente 27,3% foram indicados para infusão de apenas um tipo de solução endovenosa e 72,7% foram indicados para a infusão de múltiplas soluções endovenosas,(6). Logo, a hipótese deste estudo é que cateteres de silicone, único lúmen, calibre de 1.9 Fr que tenham sido indicados para a terapia infusional múltipla apresentam uma incidência maior de remoção não eletiva quando comparados aos cateteres indicados para a terapia infusional exclusiva.

Os estudos sobre a associação entre o tipo de terapia infusional, única ou múltipla, que indicou a inserção do CCIP e a ocorrência de remoção não eletiva do cateter em decorrência de complicações são escassos(6). Consequentemente, ainda há necessidade de estudos na população neonatal que comparem a incidência de complicações que levaram à remoção não eletiva do CCIP de acordo com a terapia infusional prescrita.

Considerando que o enfermeiro exerce papel central na inserção, manutenção e remoção do cateter epicutâneo, bem como na prevenção, identificação, e tratamento das complicações decorrentes do procedimento, justifica-se a realização do presente estudo que tem como objetivo verificar a associação entre o tipo de terapia infusional e a incidência de remoção não eletiva em cateteres epicutâneos de lúmen único, instalados em uma coorte de recém-nascidos.

 

MÉTODO

Trata-se de estudo de coorte com coleta prospectiva de dados, realizado na UTIN de um hospital privado de grande porte da cidade de São Paulo. A UTIN dispõe de 60 leitos e o quadro funcional é composto por 24 enfermeiros, dos quais 18 estão habilitados para inserção, manutenção e remoção do CCIP. Atendendo à Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, o projeto de pesquisa foi apreciado pelo Comitê de Ética da instituição hospitalar, sede do estudo e obteve aprovação para a coleta dos dados (Processo n°238/2010).

O manejo do CCIP nesta instituição segue as diretrizes definidas em protocolo elaborado pelos enfermeiros do grupo de estudos em cateteres venosos, baseado em normas descritas pelas sociedades profissionais que capacitam os enfermeiros brasileiros para manejo do CCIP. Na instituição onde os dados foram coletados, a indicação de inserção e remoção do CCIP é uma atribuição médica. A instalação do cateter é um procedimento asséptico realizado à beira do leito por enfermeiro capacitado, após a avaliação das condições clínicas e da rede venosa do neonato.

Os participantes do estudo foram selecionados a partir de um controle diário realizado pelas enfermeiras da UTIN acerca do tipo de dispositivo vascular instalado em cada neonato internado no período de 31 de agosto de 2010 a 10 de fevereiro de 2011. Foram considerados como critérios de elegibilidade: neonatos sem anomalias congênitas, nascidos na maternidade do hospital e submetidos à inserção do CCIP de silicone 1.9 Fr e lúmen único durante o período de internação na UTIN. Foram excluídos do estudo aqueles indivíduos que não possuíam registro em prontuário quanto ao dispositivo vascular em uso, solução endovenosa infundida na data de instalação do cateter, sem data ou motivo de remoção do dispositivo e que foram a óbito ou transferidos durante a permanência do CCIP.

Para o cálculo do tamanho da amostra foram utilizados os achados de um estudo transversal anteriormente conduzido com 67 recém-nascidos submetidos à inserção do CCIP na UTIN da instituição cenário da presente pesquisas(6). Adotou-se um nível de significância (α) de 5%, poder (β) de 80%, sendo que no referido estudo entre os cateteres removidos não eletivamente 72,7% estavam com terapia infusional múltipla e 27,3% com a infusão de apenas um tipo de solução endovenosa, ou seja, uma razão de 3:1 (três CCIP com terapia infusional múltipla para cada cateter com terapia infusional exclusiva) no teste bicaudal. Dessa forma, estimou-se uma amostra de 15 CCIP para o grupo com terapia infusional exclusiva e 45 CCIP para o grupo com terapia infusional múltipla. Os dados foram coletados até que o número de CCIP de silicone com um único tipo de solução endovenosa fosse atingido, resultando em uma amostra final de 97 CCIP, sendo 15 com terapia infusional exclusiva e 82 com terapia infusional múltipla.

Os dados foram extraídos dos registros do prontuário do paciente e do impresso institucional denominado Formulário de controle do CCIP, no qual a equipe de enfermagem registra as informações referentes à inserção, manutenção e remoção do dispositivo. Para o registro dos dados utilizou-se formulário próprio contendo as variáveis de interesse do estudo: diagnóstico clínico, sexo, idade pós-natal, idade gestacional e peso na data do procedimento, cateter epicutâneo utilizado (material, número de lúmens e calibre), segmento de inserção, posição da ponta do cateter (central ou não central), terapia infusional que indicou a inserção do cateter (nutrição parenteral, soro, antibioticoterapia, antifúngico, droga vasoativa) na data de inserção do cateter, tempo de permanência do cateter, data e motivo de remoção.

Considerou-se terapia infusional a solução administrada por via endovenosa. A terapia infusional que indicou a inserção do cateter foi classificada em: terapia infusional exclusiva e terapia infusional múltipla. A terapia infusional exclusiva diz respeito à indicação do CCIP para a infusão de apenas uma solução endovenosa, por exemplo, nutrição parenteral. A terapia infusional múltipla diz respeito à indicação do cateter em razão da prescrição de mais um tipo de solução endovenosa, como nutrição parenteral e antimicrobianos, ou soroterapia, drogas vasoativas e antimicrobianos.

Considerou-se remoção eletiva do CCIP aquela ocorrida em razão do término da terapêutica infusional ou da prescrição de soluções compatíveis com a administração periférica. Definiu-se como remoção não eletiva do cateter aquela motivada por complicações como: obstrução, ruptura, migração da ponta, flebite, trombose, infecção de corrente sanguínea relacionada ao cateter, edema, infiltração, extravasamento e tração acidental do cateter.

Os dados coletados foram armazenados em planilha Microsoft Office Excel 2010 e analisados no software Epi-Info 3.5.1. As variáveis contínuas foram analisadas com estatística descritiva e as categóricas, por meio de frequência absoluta e relativa. Para as variáveis categóricas, a existência de diferença entre os grupos com e sem terapia infusional múltipla foi determinada pelo teste Qui-quadrado de Pearson ou Exato de Fisher, além do cálculo do risco relativo e intervalo de confiança de 95%. Para as variáveis contínuas utilizou-se o teste t Student. O nível de significância estatística adotado foi p ≤ 0,05 com intervalo de confiança 95%.

 

RESULTADOS

Durante o período de coleta de dados acompanhou-se diariamente a instalação de cateteres epicutâneos na UTIN com a finalidade de identificar os cateteres elegíveis para inclusão na amostra do presente estudo, conforme Fluxograma 1. Por fim, 97 cateteres compuseram a amostra, sendo que desses CCIP, 15 foram indicados para terapia infusional exclusiva e 82 para terapia infusional múltipla.

 

Fluxograma 1: Fluxograma de elegibilidade dos cateteres epicutâneos instalados na coorte de neonatos. São Paulo, 2010-2011

Fonte: Arquivo pessoal dos autores

 

 

Os 97 cateteres foram instalados em 82 recém-nascidos, sendo que a maioria dos neonatos foi submetida a apenas uma cateterização (71; 86,6%). Os demais neonatos (13,4%) receberam entre dois a cinco cateteres durante sua internação. Os neonatos dos dois grupos, ou seja, aqueles com terapia infusional múltipla e aqueles com terapia infusional exclusiva, foram comparados quanto às suas características clínicas e demográficas a fim de verificar se os grupos são homogêneas, podendo, portanto, serem comparados quanto ao desfecho principal (Tabela 1).


Tabela 1. Caracterização dos neonatos submetidos à inserção do cateter epicutâneo de acordo com o tipo de terapia infusional. São Paulo, 2010-2011 
Variáveis demográficas e antropométricas Terapia infusional Valor de p
Múltipla (N=82) Exclusiva (N= 15)
Média DP Média DP
Idade gestacional corrigida (semanas) 33,4 5 35,2 3,8 0,20
Dias de vida 10,1 21 3,6 4,3 0,23
Peso (gramas) 1691,1 864,5 1901,9 799,1 0,23
Fonte: Arquivo pessoal dos autores

 

A população de neonatos caracterizou-se como sendo predominantemente do sexo masculino, 59 (60,8%), tanto entre os neonatos com indicação do CCIP para terapia infusional múltipla quanto entre aqueles com terapia infusional exclusiva, sem diferença estatisticamente significativa entre os grupos (p=0,94). Os diagnósticos clínicos mais frequentes na população estudada foram: prematuridade (87; 89,7%), desconforto respiratório (70; 70,2%), cardiopatia (16; 16,5%), sepse (15; 15,5%), distúrbios do trato gastrointestinal (09; 9,7%) e distúrbios hidroeletrolíticos (5; 5,2%). Não houve diferença estatisticamente significante entre os neonatos com terapia infusional múltipla ou exclusiva quanto aos diagnósticos clínicos (p > 0,05).

Quanto ao segmento corporal de inserção do CCIP, 79 (81,4%) cateteres foram inseridos através de veias dos membros superiores, 13 (13,4%) em veias dos membros inferiores e 5 (5,1%) através de veias da região cervical ou cefálica. Não foram observadas diferenças entre os grupos quanto ao segmento de instalação do CCIP (p=0,8). A posição da ponta do CCIP estava central na maioria dos procedimentos (85; 86,7%), sem diferença estatística significativa entre os grupos com terapia infusional múltipla ou não (p=1,0). De modo geral, as características clínicas dos recém-nascidos, e do procedimento de inserção do cateter epicutâneo nos grupos com indicação do cateter para terapia infusional múltipla e exclusiva foram homogêneas.  

A incidência de remoção não eletiva na amostra estudada foi de 35,1% (34 cateteres). Essa incidência não apresentou diferença significativa de acordo com o tipo de terapia infusional, porém foi quase 10% maior entre os cateteres epicutâneos que receberam terapia infusional múltipla.


Tabela 2. Tipo de terapia infusional e incidência de remoção não eletiva do cateter epicutâneo. São Paulo, 2010-2011
Incidência de remoção não-eletiva Terapia infusional Valor de p RR [IC]
Múltipla (n=82) Exclusiva (N= 15)
N % N %
Sim 30 36,5 4 26,7 0,33 1,15 [0,81-1,63]
Não 52 63,4 11 73,3
Fonte: Arquivo pessoal dos autores

 

Quanto às soluções endovenosas que indicaram a instalação do CCIP nos neonatos, observou-se que a maioria dos CCIP para terapia infusional única foram indicados para a administração de nutrição parenteral (40%), antibióticos (20%), soro (33,3%) e fenobarbital (6,7%). Já entre os cateteres epicutâneos indicados para terapia infusional múltipla houve predominância da indicação para infusão da combinação entre antibiótico e nutrição parenteral (31,7%), antibiótico e soro (29,3%), antibiótico, droga vasoativa e nutrição parenteral (8,5%), antibiótico, droga vasoativa e soro (7,3%) e outras soluções.

Quanto às complicações que levaram à remoção não eletiva do cateter epicutâneo, observou-se que as mais frequentes foram obstrução (26,5%) e suspeita de infecção (26,5%). A relação entre a terapia intravenosa e as complicações que levaram à remoção não eletiva dos 34 cateteres epicutâneos na coorte de neonatos encontra-se na Tabela 3.  


Tabela 3. Terapia infusional e as complicações do cateter epicutâneo. São Paulo, 2010-2011 
Complicações Terapia infusional Valor de p
Múltipla (n=30) Exclusiva (N= 4)
N % N % 0,83
Obstrução 8 26,7 1 25
Ruptura 7 23,3 1 25
Suspeita de infecção 8 26,7 1 25
Edema do membro 3 10 0 -
Extravasamento 2 6,7 0 -
Tração acidental 2 6,7 1 25
Fonte: Arquivo pessoal dos autores

 

O tempo de permanência médio dos cateteres epicutâneos instalados foi 11,1 dias. No grupo com terapia infusional única essa média foi de 11,4 (DP:13) dias e no grupo com terapia infusional múltipla foi de 11,1 (DP:10,8) dias. Não houve diferença estatística significativa entre os grupos quanto ao tempo de permanência (p=0,9).

 

DISCUSSÃO

Os avanços tecnológicos contribuíram para o aumento da sobrevivência dos recém-nascidos prematuros e gravemente enfermos admitidos nas UTIN. Contudo, esta população necessita de acesso vascular que viabilize a administração segura da terapêutica infusional prescrita. Logo, os profissionais de enfermagem estão em constante busca de aprimoramento das suas habilidades profissionais, bem como de novas tecnologias relacionadas ao material, design, número de lúmens, segurança e efetividade dos dispositivos vasculares apropriados aos neonatos criticamente doentes.

Em relação ao material, design e número de lúmen, os cateteres epicutâneos disponíveis para a população neonatal podem ser confeccionados em silicone e poliuretano, em calibres de 1.0 Fr a 3.0 Fr, com uma ou duas vias(2). Os cateteres de poliuretano possuem paredes mais resistentes, permitindo a produção de um cateter de pequeno calibre e possibilidade de maior fluxo quando comparado aos cateteres confeccionados em silicone(8). Recomenda-se a utilização do menor calibre e número de vias possível de acordo com as necessidades do paciente(1). Logo, em razão dos diversos tipos de dispositivos disponíveis a escolha do dispositivo vascular que atenda mais apropriadamente às necessidades de cada indivíduo ainda é uma prática que necessita de evidências para seu subsídio.

Os resultados da presente investigação mostraram que as principais indicações dos cateteres epicutâneos de silicone e único lúmen foram para administração de antibióticos, soro e nutrição parenteral. Resultados semelhantes foram encontrados em um ensaio clínico randomizado realizado em um hospital terciário na Suécia que buscou comparar o cateter epicutâneo ao cateter periférico. Dos 60 participantes, 31 receberam CCIP de silicone 5-Fr e único lúmen e 29 receberam o cateter periférico agulhado de poliuretano de 18 Gauge. No referido estudo, as principais indicações dos CCIP foram antibioticoterapia (61,3%), seguido de soroterapia (19,4%)(10).

A incidência de remoção não eletiva no presente estudo foi de 35,1%. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo retrospectivo que analisou 104 CCIP de silicone 1.9 Fr e único lúmen instalados em recém-nascidos admitidos em uma UTIN de Pequim, em que a incidência foi de 31,73%(11). Corroborando com estes achados, um estudo de coorte com coleta retrospectiva de dados avaliou as complicações em 808 CCIP de silicone 1.9 Fr e único lúmen instalados em neonatos de muito baixo peso em Taiwan e encontrou uma incidência de complicações de 45,5%,(12).

Os resultados do presente estudo sugerem não haver um aumento considerável do risco de remoção não eletiva em cateteres epicutâneos de única via que foram indicados para múltiplas infusões, sendo este risco apenas 15% maior (RR: 1,15). Este risco aumentado de remoção não eletiva entre os cateteres com múltiplas infusões pode estar relacionado à formação de precipitados originados da nutrição parenteral, medicamentos ácidos, e inadequada permeabilização antes e após a administração dos medicamentos,(2).

Quanto à incidência de complicações que levaram à remoção não eletiva do cateter, os resultados desse estudo apontam que esta ocorreu em 26,7% dos cateteres que receberam terapia infusional exclusiva e em 36,6% dos cateteres indicados para terapia infusional múltipla. Resultados semelhantes foram encontrados em estudo que objetivou analisar a frequência e tipos de complicações em 610 CCIP instalados para administração de antibióticos em crianças. A taxa de complicações foi de 16,2/1000 cateter-dia nos cateteres epicutâneos utilizados para administrar até quatro doses diárias de antibióticos e 23,6/1000 cateter-dia naqueles utilizados para mais de quatro doses. O risco relativo foi 1,45 vezes maior de complicações entre os cateteres utilizados para administrar mais de quatros doses diárias de antibióticos(13).

Quanto às complicações que levaram à remoção não eletiva dos cateteres epicutâneos, o edema do membro cateterizado e extravasamento ocorreram apenas entre os CCIP utilizados para terapia infusional múltipla. A incidência dessas complicações foi baixa considerando a totalidade de cateteres analisados, ou seja, 3,1% e 2,1%, respectivamente. O edema relacionado ao CCIP é causado pela má circulação e congestão venosa, sendo sua incidência de 2,9% em estudo internacional conduzido com neonatos com CCIP(11). Por outro lado, o extravasamento e a ruptura motivaram a remoção de 15,3% dos 294 cateteres epicutâneos inseridos em neonatos de uma UTIN no Reino Unido(14).

De modo geral, nesta pesquisa, a maioria dos cateteres epicutâneos foi removida eletivamente independente da terapia infusional que justificou sua inserção e tiveram tempo de permanência semelhante. Contudo, as complicações que ocorreram com mais frequência entre os cateteres removidos não eletivamente foram obstrução em 9 (9,3%) CCIP inseridos, e suspeita de infecção de corrente sanguínea relacionada ao cateter também em 9 (9,3%) CCIP. Achados semelhantes foram encontrados em estudo descritivo que objetivou identificar eventos adversos relacionados ao uso de cateteres venosos centrais em recém-nascidos hospitalizados, mostrando que obstrução do CCIP ocorreu em 19,44% dos 216 cateteres inseridos e a suspeita de infecção em 2,8%(15).

Uma vez que as complicações mecânicas e infecciosas são passíveis de prevenção, detecção precoce ou tratamento imediato, algumas modificações da prática de enfermagem poderiam ser benéficas na redução da remoção não eletiva do CCIP e melhoria da qualidade do cuidado prestado. Para a prevenção de obstrução, estudos demonstram que o uso profilático de heparina permite aos neonatos com CCIP finalizar o tratamento endovenoso em razão da redução das taxas de obstrução(16). Outras estratégias preventivas da obstrução e ruptura externa incluem a permeabilização do cateter com solução fisiológica antes e depois da administração de medicamentos, o uso de seringas de pelo menos 10 ml, e a não utilização de curativos restritivos,(2). Para prevenir a infecção relacionada ao cateter, recomenda-se a adoção de técnica asséptica correta para sua inserção, o desenvolvimento de diretrizes para o cuidado do sítio de inserção do cateter e sua manutenção, remoção precoce, e realização de programas de educação permanente para a equipe de saúde(17).

A detecção precoce das complicações depende da monitorização frequente dos sinais iniciais das complicações, tais como resistência à infusão(2), aparecimento de sinais flogísticos(16), alteração de exames laboratoriais(2) e piora clínica do neonato sem outra razão aparente(2). O tratamento imediato das complicações envolve muitas vezes a descontinuidade do uso do cateter, uso de compressas para alívio da dor e dano aos tecidos, elevação do membro afetado e medicamentos de acordo com a complicação e protocolo institucional. Por fim, a qualidade da assistência à pacientes com este dispositivo está diretamente relacionada ao controle dos riscos de infecção, em que esforços de toda a equipe de saúde devem ser aplicados a fim de viabilizar a aplicação de evidências que norteiam a prática clínica segura(18).

Embora este estudo tenha analisado uma coorte de neonatos submetidos à instalação de 97 cateteres epicutâneos, algumas limitações devem ser consideradas. Entre os cateteres removidos não eletivamente, 88,2% foram indicados para terapia infusional múltipla e apenas 11,8% para terapia infusional exclusiva. Essa proporção foi menos expressiva no estudo utilizado para cálculo do tamanho da amostra. Além disso, como se trata de estudo unicêntrico, os resultados representam o uso de CCIP em um único hospital privado com uma equipe de enfermagem específica. Todavia, este estudo contribuiu para trazer evidências ao enfermeiro no momento de escolha do tipo de cateter epicutâneo, considerando a terapia infusional prescrita ao recém-nascido. Os resultados sugerem que o enfermeiro pode optar pelo cateter epicutâneo de única via e silicone, mesmo para neonatos que recebam mais de um tipo de terapia infusional nos serviços que disponham apenas deste tipo de CCIP. Contudo, é necessário investir na prevenção das complicações mais frequentes.

 

CONCLUSÃO

A incidência de remoção não eletiva em cateteres de silicone, único lúmen, com indicação para terapia infusional múltipla foi semelhante à incidência de remoção não eletiva encontrada na literatura nacional e internacional. Complicações como edema do membro e extravasamento apareceram apenas entre cateteres com terapia infusional múltipla. Vale ressaltar que as complicações que tiveram maior incidência, obstrução e suspeita de infecção, apresentam maior incidência na literatura também. Tais complicações limitam ou reduzem o tempo de permanência do dispositivo vascular em razão de sua retirada antes do término da terapia medicamentosa. Tendo em vista que as complicações observadas podem ser evitadas, é necessário investir na capacitação dos profissionais da equipe de enfermagem para aprimorar a qualidade da assistência prestada.

 

REFERÊNCIAS

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Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a materia em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf

 

 

Recebido: 30/09/2013
Revisado:19/05/2014
Aprovado:26/05/2014