ARTIGOS ORIGINAIS

Conhecimento do enfermeiro acerca do manejo clínico da dor neonatal: estudo descritivo


Louise José Pereira Dames1, Valdecyr Herdy Alves1, Diego Pereira Rodrigues1, Renata Rangel Birindiba de Souza1, Flávia do Valle Andrade Medeiros1, Eny Dórea Paiva1
1 Universidade Federal Fluminense

RESUMO

Objetivo: analisar o conhecimento dos enfermeiros em sua prática assistencial no manejo clínico da dor neonatal.
Método: estudo descritivo, exploratório, qualitativo, realizado em duas maternidades públicas do município de Niterói com 20 enfermeiros atuantes em Unidade de Terapia Intensiva Neonatal. Os dados foram coletados por intermédio de entrevista semiestruturada e analisados visando à construção de categorias temáticas.
Resultados: as categorias encontradas foram relacionadas à percepção do enfermeiro acerca da dor neonatal e o conhecimento do enfermeiro e suas ações no manejo clínico desse sintomaneonatal. Observou-se que os enfermeiros desconhecem a prática do manejo clínico da dor, o qual não constitui uma rotina no cuidado neonatal, como também a utilização de escalas para a avaliação.
Conclusão: o conhecimento científico torna-se de suma importância, pois favorece as estratégias necessárias ao cuidado neonatal com foco na qualidade ofertada e na humanização da assistência, principalmente considerando a dor como o quinto sinal vital.

Descritores: Manejo da Dor; Recém-Nascido; Saúde da Criança; Enfermagem.


INTRODUÇÃO

A dor é uma construção social vivenciada, haja vista sua fisiologia que, embora seja comum a todas as sociedades, possui especificidades culturais determinantes em sua apresentação e na caracterização dos processos de adoecimento humano, construindo sob os aspectos sociológicos o que é possível tratar, suportar ou emitir em seu nome(1). É perceptível que a própria definição de dor evidencia o caráter verbal e subjetivo do fenômeno, dificultando a avaliação na população neonatal(2).

O conceito de dor mais utilizado é o da International Association for the Study of Pain (IASP): experiência sensorial e emocional desagradável, associada a um dano tissular real ou potencial, ou descrita em termos de tal dano(2). Essa assertiva permite a conceituação de que o processo álgico é uma experiência única e individual, modificada pelo conhecimento prévio de um dano que pode ser existente ou presumido(1).

Assim, a sua ausência constitui um dos aspectos determinantes do bem estar de um indivíduo, além de ser um dos indicadores de qualidade em saúde, especialmente na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal (UTIN), tendo em vista as profundas transformações tecnológicas e científicas ocorridas nas últimas décadas, que têm favorecido melhorias significativas no que diz respeito aos cuidados em neonatologia(3). Mas, ainda assim, na UTIN, os procedimentos invasivos necessários à realização de determinados tratamentos têm contribuído com a ocorrência de dor no cuidado neonatal, além das situações adversas como intensa luminosidade, temperatura artificial, manipulação exagerada e inúmeros aparelhos que, mesmo indispensáveis, tornam o ambiente estressante(3,4,5).

Nesse sentido, torna-se necessário o conhecimento do enfermeiro a respeito da avaliação do manejo clínico dos processos dolorosos valendo-se de vários indicadores fisiológicos, como frequências cardíaca e respiratória, pressão arterial, saturação de oxigênio, sudorese palmar e tônus vagal. Porém, é importante saber que esses indicadores não estão especificamente relacionados à dor, visto que as principais reações comportamentais do recém-nascido (RN) frente ao sintoma são choro, atividade motora e mímica facial.

Apesar de as medidas comportamentais serem mais representativas do que os parâmetros fisiológicos para a avaliação dos estímulos dolorosos, elas são dependentes da interpretação do observador acerca dos comportamentos avaliados(6). Então, há necessidade de o profissional saber reconhecer esses sinais e o desconforto vivenciado pelos neonatos. Atualmente existem as escalas de dor, cujos métodos multidimensionais permitem a avaliação e busca do máximo de informações a respeito das respostas individuais, por meio das interações com o ambiente(7).

Desse modo, a utilização de escalas e instrumentos de medida para avaliar os estímulos dolorosos - como o Sistema de codificação da atividade facial neonatal, a Escala comportamental de dor para RN, a Escala objetiva de dor Hannallah, a Escala de sedação e conforto e a Escala de avaliação da dor em neonatos no pós-operatório - tem como objetivo proporcionar a avaliação no neonato. Contudo, o enfermeiro deve estar capacitado para realizar essa avaliação, a fim de proporcionar um cuidado qualificado e humanizado aos prematuros internados na UTIN.

A partir da capacitação, dos saberes e práticas de medidas para a avaliação e alívio da dor neonatal, frente às inúmeras intervenções promovidas na UTIN, o estudo teve como objetivo analisar o conhecimento dos enfermeiros em sua prática assistencial no manejo clínico da dor neonatal.

MÉTODO

Trata-se de estudo com abordagem qualitativa, exploratório, descritivo, uma vez que não houve pretensão de quantificar dados, e sim identificar eventos(8) que traduzissem o conhecimento dos enfermeiros acerca do manejo clínico da dor na UTIN.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Medicina da Universidade Federal Fluminense (FM /UFF), sob protocolo nº 063.427/2013, conforme prevê a Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde (CNS).

Os participantes do estudo foram 20 enfermeiros das UTIN de dois hospitais da Região Metropolitana II do Estado do Rio de Janeiro, sendo um hospital universitário de atenção quaternária e outro de atenção terciária de instância Estadual. O critério de inclusão foi atuar como enfermeiro na UTIN. Excluiu-se o profissional com menos de seis meses de atuação na área.

Primeiramente, foram verificados os critérios de inclusão e exclusão estabelecidos neste estudo, e depois da sua determinação, foi feito o convite aos participantes do estudo no dia da entrevista. Após o aceite, foi solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) condicionando a respectiva participação voluntária na pesquisa, assegurando-se dessa forma o anonimato e o sigilo das informações mediante utilização de código alfanumérico (E1 a E20).

Antes do início da coleta de informações, houve ambientação dos cenários do estudo, com o intuito de observar as condições favoráveis e desfavoráveis para a aplicação do instrumento de pesquisa. Com isso, foi acordado com a coordenação das unidades que as entrevistas ocorreriam na sala de descanso, com maior privacidade e sem a presença de outra pessoa nesse momento.

Assim, utilizou-se como técnica de coleta de dados a entrevista semiestruturada individual, com base em roteiro de perguntas abertas e fechadas pertinentes ao processo do manejo clínico da dor do RN. As entrevistas ocorreram nos meses de janeiro a abril de 2014 e foram gravadas em aparelho digital com autorização prévia de cada entrevistado.

Posteriormente, as gravações foram transcritas na íntegra pelos pesquisadores e submetidas a uma leitura atentiva dos depoimentos, o que permitiu a realização da análise do material coletado, optando-se pela formulação de categorias temáticas, verificando as Unidades de Registro (UR) em que surgiram, assim possibilitando construí-las.

Isso possibilitou discutir e estabelecer o ponto de vista para o alcance do objetivo proposto no estudo, ensejando o surgimento das seguintes categorias: 1) Percepção do enfermeiro acerca da dor neonatal na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal; 2) O conhecimento do enfermeiro no manejo clínico da dor neonatal; 3) As ações do manejo clínico da dor como prática assistencial realizada pelos enfermeiros.

RESULTADOS

Percepção do enfermeiro acerca da dor neonatal na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal

Os enfermeiros confirmaram em seus relatos que o RN tem percepções dolorosas, mesmo quando prematuro, assim corroborando a literatura científica:

(...) Eu acredito que o RN sente dor sim, pois isso fica bem claro para mim quando vejo através da modificação de sinais corporais e fisiológicos quando implemento algum procedimento doloroso. (E5)

(...) Penso que os RN sentem dor sim, e a percebo por alterações dos parâmetros fisiológicos e comportamentais na realização de procedimentos potencialmente dolorosos. (E13)

No contexto da prática na UTIN, os depoentes avaliaram a dor manifestada pelo RN apenas por meio de parâmetros comportamentais ou fisiológicos associados aos comportamentais, como queda de saturação de oxigênio e alteração da expressão facial, seguidos por choro, irritabilidade e agitação dos membros, como descrito a seguir:

(...) Os neonatos sentem dor sim, porque quando faço algum procedimento que seja doloroso, eu percebo que ele muda a face. (E4)

(...) Quando eu estou manipulando o RN, ele me dá indícios físicos e clínicos de dor, como a queda da saturação, expressão facial, coloração. (E20)

Os participantes destacaram a importância da equipe de enfermagem na identificação do processo doloroso durante a realização dos cuidados e de procedimentos invasivos, comuns nessa Unidade. Destacam-se alguns depoimentos a respeito:

(...) Na minha experiência, o que eu percebo é que equipe de enfermagem, como um todo, possui esse olhar mais apurado para a questão da dor, mas quando há um enfermeiro mais engajado nos cuidados diretos aos bebês, é comum ele detectar mais facilmente do que os outros profissionais. (E9)

(...) Eu vejo que toda equipe de enfermagem é mais interessada, engajada, comprometida nessa parte de avaliação da dor do que os outros profissionais que também manuseiam o bebê. (E12)

(...) Eu acho que a enfermagem tem mais cuidado com a dor do que outros profissionais sim, porque no nosso curso, a enfermagem fala e discute mais sobre humanização, enquanto os outros profissionais acabam sendo muito mecanizados. (E17)

Desse modo, o cuidado neonatal na UTIN deve propiciar olhar acurado do enfermeiro com base nas percepções para a dor do RN, a fim de solucioná-la por meio de ações que contribuam para uma atenção qualificada e humanizada no seu manejo clínico.

O conhecimento do enfermeiro no manejo clínico da dor neonatal

Quando se tratou da importância de prevenir, minimizar e aliviar a dor do neonato hospitalizado, somente alguns participantes apontaram as implicações nas condições orgânicas e comportamentais, quando a dor não é vista e tratada adequadamente. Desse modo, a fim de exemplificar tais achados, destacam-se as faltas a seguir:

(...) Eu acho que algumas intercorrências podem ser decorrentes da dor durante a realização de procedimentos como: a piora clínica do RN, predisposição a processo infeccioso, perda de peso e presença de resíduo gástrico. (E7)

(...) Eu suponho que através da minimização da dor nós podemos favorecer a melhora do estado clínico do RN, e assim preservar o crescimento e desenvolvimento desta criança futuramente. (E8)

Porém, ao analisar mais profundamente os depoimentos dos enfermeiros, identifica-se que eles percebem e avaliam a dor por meio de critérios particulares, sem embasamento teórico e científico, fundamentais para nortear suas condutas terapêuticas com relação à dor neonatal. Os entrevistados informaram que não se sentiam aptos e capacitados quanto à avaliação da dor e seu manejo clínico, sob a alegação de deficiências no processo de formação profissional no que tange aos cursos de graduação e pós-graduação.

(...) Não fui capacitada sobre dor e seu manejo em minha formação ou mesmo na instituição em que atuo. (E2)

(...) Não me sinto capacitada no que diz respeito à dor, seja por não ter sido discutida profundamente na minha formação ou por não termos uma educação permanente mais ativa em nos capacitar nesta temática. (E15)

O nosso serviço nunca nos capacitou no que diz respeito à dor, e também admito que sinto dificuldade em discutir sobre o tema por déficit em nossa formação profissional. (E18)

Os participantes informaram que a identificação da dor e sua avaliação não são rotineiramente adotadas na instituição de saúde onde atuam, conforme depoimentos a seguir:

(...) Infelizmente, a avaliação da dor nos recém-nascidos não é feita de forma rotineira na unidade. Talvez, isso se explica por não haver uma cobrança ou norma existente no serviço com diz respeito a dor e seu manejo. (E1)

(...) Aqui na unidade, a avaliação da dor em neonatos não faz parte de nossa rotina no trabalho, talvez porque não haja nenhuma norma a respeito disto. (E11)

(...) A nossa unidade não tem como rotina identificar a dor, e nem tampouco avaliá-la conforme os referenciais teóricos apontam. Talvez, nós profissionais até aproveitamos dessa desculpa para não fazê-la. (E20)

A carência de instrumentos de avaliação na prática profissional do enfermeiro pode ser observada em relação ao manejo clínico da dor do RN, além do desconhecimento de qualquer escala de avaliação. Seguem-se depoimentos a respeito:

(...) Eu não me lembro das escalas agora porque eu não utilizo nenhuma. (E5)

(...) Eu não me recordo das escalas de dor para estar te exemplificando. (E12)

(...) A instituição não faz uso de instrumento ou escala de avaliação de dor neonatal. Sei que existem, mas não sei o nome delas e que parâmetros são avaliados. (E17)

Infere-se pelos relatos acima que, para atuar junto ao neonato no manejo clínico da dor, os enfermeiros precisam ter conhecimentos específicos a respeito dessa questão, além de saber utilizar os instrumentos para avaliação dos estímulos dolorosos, todos acessíveis na literatura científica ou eventualmente disponíveis na instituição, a fim de que a assistência resulte no alívio da dor e no bem estar da criança.

Ações do manejo clínico da dor como prática assistencial realizada pelos enfermeiros As intervenções não farmacológicas objetivam reduzir os estímulos agressivos do ambiente, diminuir o estresse e prevenir alterações fisiológicas e comportamentais. Com base nos depoimentos dos participantes, confirma-se que na observância da presença de dor, foram solicitadas prescrições de terapias farmacológicas para o alívio, sem promover nenhum outro mecanismo não farmacológico para aliviar os estímulos dolorosos:

(...) Não é comum os médicos prescreverem analgésicos ou sedativos em decorrência de procedimentos invasivos cirúrgicos ou não, e sim, normalmente, nós enfermeiros em caso de identificação de dor no RN, solicitarmos a prescrição de algum analgésico para ser administrado. Comumente é utilizada a dipirona nos casos mais comuns de dor, e quando necessário utilizamos também o fentanil endovenoso em certos procedimentos. (E4)

(...) Normalmente não vejo os médicos prescrevendo medicações para dor no nosso serviço, a não ser que nós enfermeiros sinalizemos para eles a vigência da dor no RN, e aí sim, os medicamentos são prescritos e administrados. Aqui na unidade quando há prescrição medicamentosa só vejo o uso de dipirona endovenosa. (E14)

Contudo, a utilização de medidas não farmacologias para o alívio da dor neonatal, como: sucção não nutritiva, utilização de glicose oral, conforto, posicionamento, manuseio mínimo, redução de luminosidade e ruídos, bem como pedir a ajuda de outro profissional para realizar procedimentos invasivos. Seguem-se depoimentos a esse respeito:

(...) Eu procuro enrolar o RN e utilizo a glicose a 25% antes da realização de algum procedimento invasivo, e também quando possível procuramos agrupar os cuidados para evitar o manuseio excessivo. Quanto ao ambiente tento humanizá-lo reduzindo a luz e o ruído do ambiente(E2)

(...) Eu quando realizo algum procedimento invasivo me preocupo em enrolar o bebê, oferecer glicose oral por meio de sucção não-nutritiva e oferecer um posicionamento adequado. Além de tentar manter um ambiente tranquilo, e/ou também, quando possível tento reduzir a luz do ambiente(E8)

(...) Que eu me lembro no momento, tento diminuir a manipulação excessiva agrupando os cuidados, utilizo glicose por sucção não-nutritiva na realização de procedimento invasivo, procuro conter o RN, e se necessário chamo outro profissional para ajudar no cuidado. Já no ambiente procuro reduzir o ruído e diminuo a luminosidade sobre o neonato buscando maior conforto(E19)

Na perspectiva dos enfermeiros, o manejo clínico da dor não se faz efetivo em decorrência de não haver na instituição nenhum protocolo assistencial voltado para a dor neonatal, conforme relatos a seguir:

(...) Eu creio que por não possuirmos protocolo para dor, muitos neonatos podem sofrer de dor por não serem adequadamente avaliados e tratados. (E2)

(...) Eu percebo que muitas coisas deixam de ser feitas nos cuidados com os bebês por não termos protocolos assistenciais bem definidos e discutidos com os profissionais de enfermagem. (E11)

(...) Eu percebo que o processo doloroso passa despercebido em nosso serviço por não possuirmos um protocolo para nortear nossos cuidados durante a realização de procedimentos que causem dor nos neonatos. (E13)

Assim, torna-se necessária a utilização de medidas que contribuam para o alívio da dor neonatal, por meio de protocolos que utilizem a prática do enfermeiro no manejo clínico desse sintoma, pois, como ressaltado, esse sinal é o quinto sinal vital que deve ser observado na prática cotidiana do profissional de saúde, com o propósito de fornecer ao neonato uma assistência humanizada e de qualidade.

DISCUSSÃO

A dor é um dos sintomas mais antigos da história da medicina, uma sensação desagradável vivenciada por todos no decorrer da vida, que pode ser potencializada por uma patologia ou decorrer de determinados procedimentos durante a internação(9). A sua percepção deve ser compreendida pelos profissionais de saúde como uma experiência que se caracteriza pela complexidade, subjetividade e multidimensionalidade de inúmeros aspectos envolvidos em seu processo, que variam de acordo com a percepção de cada ser humano(2).

É preocupante a carência de conhecimento da dor como uma variável vital a ser avaliada na prática clínica diária, pois, diante do atual Estado da Arte em que a produção recente do conhecimento relativo à dor no período neonatal é considerada escassa, corre-se o risco de realização de procedimentos invasivos e potencialmente dolorosos sem as devidas intervenções para o alívio(3), e também de ocorrência de iatrogenias.

Os enfermeiros do estudo mencionaram a percepção da dor neonatal, um indicativo de que os neonatos sentem processos dolorosos por terem terminações nervosas que propagam os impulsos dolorosos a partir da 20ª semana de gestação. E dentre os parâmetros que os depoentes caracterizaram como sinais de dor, estavam os comportamentais e os fisiológicos durante a realização de procedimentos potencialmente dolorosos, sinais apontados na literatura científica como importantes indicadores para a avaliação da dor neonatal na UTIN(10). Reflexos comportamentais como movimentos corpóreos, irritação, agitação e choro constituem respostas comportamentais referentes à dor(11). As respostas fisiológicas incluem aumento das frequências cardíaca e respiratória, elevação da pressão intracraniana, sudorese e diminuição da saturação da hemoglobina pelo oxigênio e do tônus vagal(7). Assim, os enfermeiros devem permanecer atentos e sensibilizados a essas alterações no momento da internação do neonato na UTIN, pois elas acompanham os episódios dolorosos(12).

A abordagem do manejo da dor em neonatos por parte da enfermagem baseia-se nos cuidados oriundos da prática profissional humanizada, que permite perceber e sentir o RN de forma diferenciada no decorrer do período de internação. Então, a percepção da sutileza da expressão de processos dolorosos no bebê, de realizar uma melhor leitura corporal, da aplicabilidade mais consensual e amplamente humanizada das técnicas explicitadas em UTIN constituem prática fundamental para o cuidado neonatal(13).

No cotidiano da UTIN, acredita-se que vários fatores estejam relacionados com essa desvalorização da dor, principalmente pela falta de conhecimento dos participantes, dentre os quais alguns conceitos equivocados sobre o tema, desconhecimento dos sinais expressos pelos RN, acúmulo de atividades dos profissionais de saúde impedindo que priorizem a avaliação da dor, e até mesmo falta de sensibilidade para os efeitos nocivos do processo doloroso durante a hospitalização(14). Todavia, é importante lembrar que, como parte dos cuidados de rotina nas UTIN, calcula-se que todos os RN gravemente enfermos sejam submetidos a cerca de 50 a 150 procedimentos dolorosos por dia. Essa elevada carga de procedimentos e estímulos causam efeitos nocivos na sua organização comportamental e fisiológica, gerando um estresse crônico que implicará na utilização de suas reservas energéticas que, normalmente, seriam direcionadas para o seu crescimento, restabelecimento e desenvolvimento(15).

Sendo assim, é de grande importância o conhecimento dos enfermeiros sobre os mecanismos fisiopatológicos que envolvem o processo doloroso do RN, para que se conscientizem da importância da sua avaliação e tratamento(14). A carência de conhecimentos dos enfermeiros acerca das desordens desencadeadas no organismo do RN traz à tona a necessidade de capacitação profissional para o manejo da dor neonatal.

Percebe-se, também, a escassez de critérios utilizados para a avaliação da dor no RN, levando o enfermeiro a utilizar seus próprios critérios sem o necessário embasamento científico para nortear suas condutas terapêuticas em relação ao manejo clínico da dor, temas que não foram abordados relevantemente durante a sua formação acadêmica. Considerando que há evidências científicas de que o neonato apresenta um modo característico de expressar a dor por meio de uma linguagem própria, torna-se importante a implementação das escalas, que deveriam ser utilizadas como instrumentos para essa percepção, visto que se destinam a facilitar a interação e a comunicação entre os membros da equipe de saúde e que, sendo adotados rotineiramente, permitiriam perceber a evolução da dor em cada paciente, bem como verificar a resposta desses neonatos frente à terapia em curso(16)Nesse sentido, faz-se necessária a capacitação dos profissionais de enfermagem no sentido da realização de estudos mais aprofundados a respeito do tratamento da dor.

A falta de rotina institucional de avaliação da dor neonatal na UTIN, além do desconhecimento, pelos enfermeiros, de escalas que avaliem esses processos dolorosos, compromete o cuidado oferecido ao RN. Torna-se preocupante, portanto, a constatação desse desconhecimento e, do mesmo modo, da inexistência na instituição das diversas escalas para serem utilizadas no cotidiano profissional, considerando que elas foram criadas para auxiliar na identificação mais precisa do processo doloroso. Sendo assim, infere-se que é urgente rever essa questão, porque não sendo as escalas aplicadas adequadamente, pode haver comprometimentos prejudiciais à saúde do neonato, levando ao retardo da implementação de cuidados efetivos e potencializando alterações na sua condição orgânica.

A conduta do enfermeiro em relação à avaliação da dor neonatal, deve se tornar rotina na sua prática na UTIN, seja por meio de métodos comprovados de avaliação, ou alterações comportamentais e fisiológicas expressivas do neonato. Nesse sentido, a abordagem no manuseio da dor poderia ser incrementado de forma a se adequar aos padrões propostos pela Academia Americana de Pediatria. Uma estratégia nessa direção incluiria a discussão com todas as equipes de profissionais da saúde a respeito das variáveis que facilitam ou dificultam a efetiva adoção de medidas adequadas ao alívio durante a realização de procedimentos invasivos na UTIN(17).

Os participantes objetivam reduzir os estímulos agressivos ao RN por meio de terapias farmacológicas para o alívio da dor, principalmente por meio de anestésicos, sedativos em decorrências dos procedimentos invasivos. Todavia, o cuidado de enfermagem ao neonato na UTIN vai além do controle do estado físico. A observação das demandas sutis, como as demonstrações de desconforto, contempla o cuidado de excelência e humanizado que envolve reconhecer os sinais de dor, implementando ações efetivas, que são metas assistenciais a serem atingidas, dentre elas, as classificadas como as não farmacológicas, que podem ser utilizadas com autonomia pelo enfermeiro(18). Contudo, as principais medidas de alívio da dor pelos entrevistados resultam da administração de medidas farmacológicas.

Mas, alguns dos participantes destacaram medidas não farmacológicas para o alívio da dor neonatal, conforme a literatura científica descreve, com a utilização de medidas como: sucção não-nutritiva; uso de glicose oral; conforto; posicionamento; manuseio mínimo; redução de luminosidade e ruídos; bem como pedir a ajuda de outro profissional para realizar procedimentos invasivos. Essas intervenções objetivam, principalmente, prevenir a intensificação de um processo doloroso, a desorganização do neonato, o estresse e a agitação, ou seja, minimizar as repercussões da dor. Podem ser utilizadas individualmente na dor de leve intensidade, mas frente à dor moderada ou severa, deverão ser acrescidas intervenções farmacológicas(18). As medidas citadas pelos entrevistados constituem normativas para o alívio da dor, principalmente nos casos de sucção não-nutritiva, uso de glicose oral, conforto, redução de luminosidade e ruídos.

Dentre as soluções mais estudadas, a sacarose e a glicose têm merecido destaque por apresentarem melhor efeito analgésico. Tal resultado pode ser observado pela diminuição na duração do choro, atenuação da mímica facial de dor, minimização da elevação da frequência cardíaca. Proporcionar o conforto no RN constitui outra medida de alívio para a dor ao neonato, o qual tem por objetivo de propiciar o aconchego, colocando-o em posição confortável para que se sinta protegido. Os efeitos da sucção não nutritiva associam-se ao aumento na oxigenação, à melhora nas funções respiratória e gastrintestinal e à diminuição da frequência cardíaca e do gasto energético, promovendo descanso e analgesia(4). Reduzir a luminosidade e os ruídos considerados estímulos agressivos e desnecessários, principalmente na UTIN, possibilitam uma atenção mais qualificada ao neonato(19). Para tanto, basta desligar os celulares, reduzir o som das companhias do telefone e dos volumes das bombas, dentre outras medidas simples e de fácil acesso a qualquer profissional.

O manejo clínico da dor não se faz presente do cotidiano dos enfermeiros sob a justificativa da falta de protocolos assistenciais. Mas, é evidente que a existência de um protocolo assistencial voltado para a dor, por si só, não garante a avaliação e o tratamento da mesma, caso não haja comprometimento e empenho dos profissionais envolvidos. O fator institucional a ser levado em conta é a falta de normatização que facilitem a seleção correta de medicamentos, sua administração adequada e a monitoração cuidadosa, que podem melhorar a qualidade da sedação e da analgesia, além de evitar efeitos adversos. Por essa razão, alguns consensos internacionais que estabelecem normatizações para o manejo adequado da dor neonatal já foram publicados, muito embora poucas instituições possuam protocolos e utilizem as escalas para avaliar os processos dolorosos do RN durante os procedimentos. Na maioria dos hospitais, não há registro nos prontuários do uso de escalas ou de tratamento analgésico. Entretanto, a presença de normatizações escritas pode melhorar a atenção à dor nas UTIN(20).

É extremamente desafiadora a geração de discussões construtivas no âmbito das equipes no que se refere à adoção de condutas para minimizar a dor na prestação dos cuidados a esses neonatos, já que serão estas ações crítico-reflexivas que nortearão os enfermeiros e da equipe de enfermagem na elaboração e implementação de protocolos para o manejo clínico da dor. Observa-se que a influência de fatores pessoais, o pouco entendimento entre os profissionais, as dificuldades de comunicação com os familiares e a falta de recursos humanos, prejudicam a avaliação e, consequentemente, a minimização da dor neonatal(20).

CONCLUSÃO

Os entrevistados percebem e avaliam a dor por meio de critérios particulares, sem embasamento teórico e científico, fundamentais para nortear as suas condutas terapêuticas com relação à dor neonatal.

A carência de conhecimento quanto ao manejo clínico da dor, compromete a assistência ofertada ao recém-nascido, além de contribuir para uma atenção desqualificada, especialmente porque na UTIN a avaliação da dor neonatal é imprescindível em razão dos inúmeros procedimentos aos quais o RN é submetido, além da estrutura ambiental que favorece a sua irritabilidade e, consequentemente, promove os estímulos dolorosos.

E para que haja uma mudança quanto ao manejo clínico da dor, torna-se necessária a atuação do Serviço de Capacitação Permanente das Unidades de Saúde no sentido do aprimoramento dos profissionais de saúde, em especial dos que integram a equipe de Enfermagem, a respeito do manejo clínico da dor, além da institucionalização de protocolo assistencial com o propósito de guiar a prática profissional no alívio dos processos dolorosos ao RN.

Assim, o estudo traz à tona a necessidade de uma mudança quanto ao manejo clínico da dor, a ser feita de forma consciente, respaldada na ética profissional e no cuidado integral e humanizado realizado junto ao recém-nascido na Unidade de Terapia Intensiva Neonatal.


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Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a materia em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf

Recebido: 28/11/2015 Revisado: 14/06/2016 Aprovado: 21/06/2016