ARTIGOS ORIGINAIS

Indicadores para avaliação da qualidade da assistência de enfermagem: estudo descritivo-exploratório


Vitoria Regina Souza Pinto1, Simone Cruz Machado Ferreira1

1Universidade Federal Fluminense

RESUMO

Objetivo: identificar os principais indicadores para avaliação da qualidade da assistência de enfermagem na perspectiva de enfermeiros. Método: pesquisa descritivo-exploratória, de abordagem qualitativa, com 14 enfermeiros de unidades de clínica médica de um hospital universitário do Rio de Janeiro. Os dados foram coletados por entrevista semiestruturada e tratados por estatística descritiva e análise de conteúdo. Resultados: segundo relatos dos enfermeiros, os três indicadores prioritários foram: incidência de lesão por pressão, incidência de queda e incidência de flebite. Conclusão: A avaliação dos fatores de riscos que podem desencadear a lesão por pressão, a queda e a flebite está no âmbito de atuação do enfermeiro, que podem desenvolver estratégias preventivas que se alicerçam em protocolos de enfermagem, como a mudança de decúbito, a avaliação e troca de dispositivos de acesso vascular.

Descritores: Indicadores de Qualidade em Assistência à Saúde; Enfermagem; Qualidade da Assistência à Saúde.


INTRODUÇÃO

O uso de indicadores de qualidade em saúde para avaliação da qualidade da assistência é de suma importância na melhoria dos processos, principalmente quando o objetivo é buscar, nos programas de acreditação, as certificações das instituições hospitalares. A preocupação com a qualidade assistencial prestada nas unidades de saúde justifica-se, pois as exigências dos cidadãos se tornam maiores, uma vez que se encontram mais conscientes de seus direitos e com melhor nível de informação(1).

Partindo da premissa que o monitoramento dos processos de trabalho nos cuidados assistenciais, através da análise comparativa de resultados de indicadores, são importantes para a avaliação dos serviços hospitalares, entende-se que o uso de indicadores de qualidade é valioso para nortear ações no plano de gestão das unidades de saúde(2).

Os indicadores de qualidade podem ser compreendidos como medidas utilizadas para ajudar a diagnosticar uma situação existente, avaliar mudanças ou tendências durante um período de tempo e avaliar, qualitativamente e quantitativamente, as ações de saúde executadas(3).

A elaboração de indicadores destaca-se como uma estratégia para aferir a qualidade assistencial, gerenciar resultados, fortalecer a confiança com os usuários, e subsidiar a avaliação dos serviços e a tomada de decisão por parte dos gestores(4). Portanto, devem ser de fácil análise e interpretação e, ainda, compreensíveis para todos os usuários da informação.

O gerenciamento das informações assistenciais é parte importante dos processos de gestão da qualidade do cuidado, pois depende e impacta sobre todas as atividades desenvolvidas nas instituições de saúde, especialmente numa unidade hospitalar, que se caracteriza por sua complexidade assistencial e produção maciça de informações(5).

Nesse contexto, a avaliação da qualidade da assistência de enfermagem tem grande relevância, já que se trata de um grupo profissional que, no desenvolvimento de seu processo de trabalho, tem a oportunidade de interagir diretamente e de forma contínua com o usuário, refletindo, portanto, em grande medida, na qualidade da gestão e assistência da unidade hospitalar(6.

Para que os enfermeiros possam desenvolver ferramentas de avaliação de seu trabalho, é necessário coletar informações confiáveis que revelem a realidade da assistência prestada cotidianamente, de maneira consistente e sistemática. Nessa seara, elaborar e utilizar indicadores de avaliação do cuidado ao paciente se constitui instrumento importante de análise dos processos de trabalho, possibilitando reflexões e melhorias que tenham impacto na segurança do paciente(7).

As instituições ao adotarem indicadores como ferramenta gerencial para aferir a qualidade do cuidado de enfermagem, devem construir uma cultura de avaliação, preconizando uma orientação educativa para análise de informações e elaboração de indicadores de impacto, com o olhar voltado para a excelência da assistência prestada. E, para tal, incute-se aos enfermeiros a definição de um conjunto de indicadores indispensáveis para o monitoramento de sua prática(7).

Ante ao exposto, assumiu-se como objetivo desta pesquisa: identificar os principais indicadores de avaliação da qualidade da assistência de enfermagem em unidades de clínica médica sob a perspectiva de enfermeiros.

MÉTODO

Trata-se de uma pesquisa descritivo-exploratória, qualitativa, desenvolvida num hospital universitário localizado no estado do Rio de Janeiro, tendo como cenário as unidades de clínica médica.

Participaram desse estudo 14 profissionais selecionados por meio dos seguintes critérios de inclusão: enfermeiros, servidores ativos do quadro permanente (estatutários) ou do processo seletivo (temporários), atuantes em uma das unidades de clínica médica. Foram excluídos àqueles que estivessem em férias ou licenças durante o período de coleta de dados de março a maio de 2014. A coleta de dados ocorreu por meio de entrevista semiestruturada individual com os enfermeiros, realizada nas dependências do hospital, em local reservado, após contato prévio para agendamento. Cada entrevista durou, em média, 25 minutos, as quais foram gravadas com autorização do entrevistado.

As entrevistas iniciaram-se com uma explicação sobre a avaliação da assistência de enfermagem utilizando indicadores de qualidade, com a apresentação por escrito da definição de indicador de qualidade.

O roteiro desenvolvido para a entrevista foi constituído de três partes. A primeira parte referente ao perfil dos participantes, em que eles responderam perguntas que geraram dados de identificação e informações sobre o tempo de formação e exercício profissional, tempo de experiência com uso de indicadores de qualidade, tempo de atuação na instituição e nível de qualificação profissional. A segunda parte foi composta por uma questão aberta, na qual solicitou-se aos enfermeiros que propusessem indicadores de avaliação da assistência de enfermagem.

A terceira parte foi constituída por uma questão fechada, em que os indicadores assistenciais do Manual de Indicadores de Enfermagem do Núcleo de Apoio à Gestão Hospitalar (NAGEH)(1) foram apresentados aos enfermeiros e solicitado que atribuíssem para cada indicador, um grau de prioridade para avaliação da qualidade da assistência da enfermagem em clínica médica (este variava de cinco (5) a um (1), quanto mais próximo de cinco, maior o grau de prioridade), bem como justificassem, de forma livre e escrita, a escolha dos três indicadores elencados.

O Manual de Indicadores de Enfermagem do NAGEH está fundamentado na metodologia de avaliação empregada no Programa Compromisso com a Qualidade Hospitalar (CQH).

O NAGEH é um subgrupo do programa CQH, que é formado por profissionais de diferentes hospitais e visa estimular a troca de informação e melhoria da qualidade dos serviços, por meio da criação, padronização e validação de indicadores. Desenvolve atividades voltadas para a melhoria da gestão hospitalar, e tem o objetivo de fazer a mensuração e a comparação coletiva dos indicadores de enfermagem nos serviços de saúde(1).

O CQH foi criado em 1991 e é mantido pela Associação Paulista de Medicina e pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo, e tem como finalidade avaliar a qualidade dos serviços prestados aos usuários dos hospitais participantes de São Paulo, baseando-se no registro, na análise de dados, e na aferição da adequação dos serviços em conformidades com suas normas e critérios(1).

Para a organização dos relatos das entrevistas, os registros foram mantidos em ordem cronológica, por meio da numeração e da data da entrevista. Empregou-se a estatística descritiva, com uso de frequência simples para os dados relativos ao perfil dos enfermeiros e à frequência das respostas. O conteúdo verbal das entrevistas foi analisado descritivamente seguindo os passos propostos para a análise de conteúdo, quais sejam: transcrição, organização do material e leitura do material; exploração do material, destacando-se trechos importantes do conteúdo; bem como interpretação e inferência.

A pesquisa foi aprovada por Comitê de Ética e Pesquisa do hospital universitário, cenário deste estudo, em 15 de novembro de 2013, sob o parecer nº 458.862, registro CAAE: 21758113.9.0000.5243, de acordo com a Resolução nº 466/2012.

RESULTADOS

Perfil dos participantes

Conforme Tabela 1, dos 14 enfermeiros que participaram desta pesquisa, a maior parte é do sexo feminino, com idades entre 41 a 45 anos, plantonistas, com maior titulação correspondente à especialização. Todos possuem vínculo de servidor estatutário, com exceção de um, com tempo de formação superior a cinco anos. No que tange à experiência com uso de indicadores, somente um relatou experiência efetiva, seis nunca utilizaram e sete informaram que possuem pouca experiência quanto ao uso destes.

Tabela 1. Perfil dos enfermeiros participantes da pesquisa. Niterói, RJ, 2014

Tabela 1

Indicadores de qualidade da assistência de enfermagem

Os dados apresentados na Tabela 2 evidenciaram os indicadores que poderiam ser elaborados, medidos e controlados na clínica, de acordo com a opinião dos enfermeiros.

Tabela 2. Indicadores de avaliação da qualidade da assistência de enfermagem relatados pelos enfermeiros. Niterói, RJ, 2014

Tabela 2

Foram sugeridos 16 indicadores pelos enfermeiros, entre os quais os mais citados e considerados prioritários para a clínica médica foram: o risco de queda, lesão por pressão e incidência de flebite.

No que tange aos indicadores lesão por pressão e queda do paciente, os entrevistados relacionaram a importância desses indicadores ao perfil dos pacientes internados na clínica médica - acamados, idosos, debilitados, mas cuja frequência está muito associada à prática de enfermagem.

[...] ela [lesão por pressão] dá uma avaliação tanto da qualidade da assistência de enfermagem, quanto de diferentes cuidados, e principalmente a qualidade da assistência que é prestada pela enfermagem fora daquilo que está prescrito (entrevista 04)

[...] lesão por pressão, porque inclusive até utilizamos a escala de Braden, esse indicador é muito importante, apesar disso a gente já anda trabalhando, inclusive até muitas lesões já foram fechadas, por conta dessa preocupação, desse empenho. (entrevista 05)

[...] incidência de paciente com lesão por pressão, aí poderia relacionar com mudança de decúbito. (entrevista 07)

[...] lesão por pressão pelas características de nossa clínica, idosos, acamados, debilitados, pacientes neurológicos, desnutridos, com fatores de riscos para o desenvolvimento da lesão. (entrevista 08)

[...] outro ponto interessante é a prevenção de lesões por pressão, evitar que o paciente apareça com lesões, mantê-lo com a pele mais íntegra possível, para não piorar o quadro geral do paciente, evoluir para uma sepse. (entrevista 10)

[...] eu acho que o primeiro, que já está em prática aqui, que é a escala de Braden, que é avaliar o risco de lesão por pressão. A gente estava dando continuidade, está meio disperso, eu acho que é a primeira. (entrevista 12)

[...] o indicador de queda nem sempre está relacionado à questão da idade do paciente, mas muito ao estado geral desse paciente, tanto pode ser paciente idoso, jovem ou adulto, esse indicador exige uma avaliação do estado físico, mas uma avaliação que exige que o enfermeiro vá a beira do leito, converse com o paciente, sinta subjetivamente, perceba o nível de consciência, para, a partir daí, traçar um diagnóstico em relação à possibilidade ou não de queda, portanto, um diagnóstico que é feito no contato direto com esse paciente. (entrevista 03)

[...] a gente tem pacientes cardiológicos, quase todos fazem uso de diuréticos, e aí o banheiro é longe, levantam a noite correndo, apressado para urinar, aí nisso acabam tendo o risco de cair, existe um grande número de doentes que fazem uso de medicações controladas

[...] e aí de manhã tá sempre sonolento [...]. Os pacientes com síndrome demencial, se a gente der mole e deixar a grade abaixada, ele levanta do leito e acaba caindo. (entrevista 04)

[...] Paciente com perfil idoso, né, nem sempre deambula efetivamente, com alteração de marcha, se a gente não fica de olho, realmente caem, sem falar do delírio, pertinente por conta da faixa etária, nem sempre fica com acompanhante. (entrevista 09)

[...] eu acho, assim, o risco em relação à segurança dos pacientes. É o risco de queda de acidentes, é, assim, a gente tem pacientes com dificuldade de deambulação, geralmente, assim, acontece algumas vezes, e a gente não notifica, sabe, com o rigor que deveria ser, da minha parte eu procuro deixar registrado no prontuário. (entrevista 12)

O uso do indicador flebite é legitimado através do grande número de acessos vasculares realizados diariamente nos serviços de saúde, que, por serem procedimentos invasivos tem grande potencial de risco, podendo levar a eventos adversos e complicações(8).

[...] a questão de infecção por flebite. Pacientes ficam internados por um período muito longo, ficam com acesso vascular periférico durante um período extenso também. Acho que esse controle também vai melhorar o processo de trabalho e diminuir os riscos de infecção e a permanência do paciente na clínica médica. (entrevista 01)

[...] o indicador de flebite também fala diretamente de uma qualidade que normalmente não está prescrita, mas ela é da presença da enfermagem à beira do leito, nas vinte e quatro horas, observando esse acesso venoso periférico, independente desta programação que é feita pela enfermagem para 72 horas, troca do dispositivo e dos equipos. Um paciente pode desenvolver a flebite na primeira, na segunda hora, como pode desenvolver em três dias, mas se não tiver uma atenção e se limitar apenas a uma observação no momento que se vai fazer esta troca, a flebite já pode ter evoluído, com um complicador muito grande para a saúde desse paciente. (entrevista 03)

[...] flebite, aqui embora não seja muito frequente, mas a quantidade de antibióticos, enfim, podem causar flebite. (entrevista 08)

Apesar de apenas quatro enfermeiros terem sugerido o número de profissionais como um indicador importante a ser analisado, a maioria deles discorreu sobre a importância das dimensões estrutura e processos e sua relação com a qualidade da assistência de enfermagem prestada.

[...] o recurso humano profissional é deficitário para que eles possam fazer, na verdade, a assistência mais adequada. (entrevista 01)

[...] o número de funcionários, ainda mais agora que estamos em um processo de transição. Então a gente depende da mão de obra, depende de cálculo de pessoal, realmente é uma clínica em que ficam pacientes graves, que necessitam de cuidados integrais, necessita do técnico o tempo todo vigiando. (entrevista 07)

[...] a falta de profissionais; às vezes o número de funcionários não é suficiente, tem falta, que prejudicam a assistência. (entrevista 08)

[...] a própria estrutura física aqui deve ser levada em consideração, que interfere na qualidade da assistência, pela não visualização do paciente no momento mais imediato, você não é multipresente. (entrevista 11)

[...] as enfermarias foram adequadas parcialmente para atender esses pacientes, gera um grande estresse, e em alguns momentos uma assistência que poderia ser de alta qualidade, de excelência em um hospital universitário, fica prejudicada por essa deficiência de espaço (entrevista 11)

[...] porque a estrutura da unidade não permite que você tenha uma visão no todo, então é uma enfermaria que você só vai ver se entrar, você não olha pra enfermaria e tá todo mundo ali, são divididas, é péssimo para você fazer um controle. (entrevista 04)

Em todas as entrevistas, observou-se uma preocupação dos enfermeiros com a segurança dos pacientes, pois relacionavam o indicador sugerido com possíveis prejuízos aos usuários, tais como infecção hospitalar e eventos adversos.

Em se tratando dos indicadores do Manual NAGEH relacionados, os enfermeiros identificaram aqueles que poderiam ser elaborados, medidos e controlados na clínica médica, sinalizando o grau de prioridade estabelecido, conforme Tabela 3.

Tabela 3. Indicadores do Manual NAGEH relacionados por grau de prioridade pelos participantes da pesquisa. Niterói, RJ, 2014

Tabela 3

Como se observa na Tabela 3, os três indicadores considerados como prioritários foram os mesmos três mais relacionados pelos enfermeiros, de forma livre, na etapa anterior da entrevista: lesão por pressão, flebite e queda do paciente. As justificativas para a escolha desses indicadores como os mais importantes se alicerçam no perfil da clientela da clínica médica e nas possibilidades de prevenção de danos à saúde do paciente e garantia de sua segurança.

Os pacientes acamados ficam internados por tempo prolongado (Entrevista 05)

Diminuir risco de infecção relacionado a lesões, assim como tempo de internação do paciente (Entrevista 07)

Melhoramos muito depois que fizemos a escala de Braden, é necessária uma continuidade mais rigorosa (Entrevista 12)

Pelas características da clientela (idade, patologia), apresentam risco maior de queda (Entrevista 08)

Diminuir infecção hospitalar relacionada a dispositivo de medicação (Entrevista 07)

Pacientes idosos, administração de medicamentos vesicantes (Entrevista 08)

DISCUSSÃO

A utilização de indicadores relativos à assistência de enfermagem tem sido considerada imprescindível para a avaliação da qualidade dos serviços de saúde, já que os profissionais dessa categoria estão em contato diário e direto com o paciente. Assim, a avaliação e análise constantes do cuidado de enfermagem se fazem oportunas e podem subsidiar processos que objetivem alcançar a excelência das instituições de saúde.

Para tal, é essencial o envolvimento dos enfermeiros da instituição nos processos de avaliação e monitoramento da qualidade do cuidado que desenvolvem, e na definição do que se quer medir, compreendendo que suas ações podem interferir nas ações de outros profissionais e no bem-estar do paciente(9). Não obstante, os dados da pesquisa destacam a inexperiência da maioria dos enfermeiros entrevistados com relação a processos de avaliação que se baseiam em indicadores de qualidade. Pode-se inferir que seja decorrente de fatores tais como: a pouca discussão sobre indicadores durante a graduação; e a dificuldade de compreensão e adaptação aos processos que envolvem a acreditação hospitalar por parte dos profissionais que nunca trabalharam em uma unidade acreditada ou em busca do selo de acreditação(10).

A acreditação é definida pela Organização Nacional de Acreditação (ONA) como um sistema de avaliação e certificação da qualidade de instituições de saúde, possui caráter educativo e objetiva a qualificação contínua da assistência(11). Esse sistema considera as três dimensões da tríade proposta por Donabedian, a saber: estrutura, processos e resultados(12). A estrutura compreende os fatores humanos, físicos, materiais e financeiros; o processo relaciona-se às ações que envolvem profissionais e pacientes; os resultados correspondem ao produto fim do cuidado desenvolvido(13).

Os enfermeiros desse estudo indicaram livremente indicadores de qualidade que se alicerçam nessas dimensões. No que tange à estrutura, o indicador número de profissionais foi citado por quatro dos 14 entrevistados. Trata-se de um indicador controlado pelos gerentes dos serviços de enfermagem, e não pelos enfermeiros assistenciais diretamente. Entretanto, há que se considerar, pois o número inadequado de profissionais pode contribuir para maior sobrecarga de trabalho e insatisfação profissional(14).

Um estudo realizado em dez hospitais de ensino do estado do Paraná identificou que grande parte deles utiliza indicadores gerenciais relativos à avaliação da qualidade da assistência de enfermagem, entre eles a distribuição enfermeiros/leito, a distribuição técnicos e auxiliares de enfermagem/leito e taxa de absenteísmo de enfermagem(6).

Em se tratando da dimensão processos, os enfermeiros apontaram os indicadores de incidência de lesão por pressão, incidência de queda do paciente e incidência de flebite, como sendo os prioritários para avaliação do cuidado de enfermagem. Eles também foram considerados como os mais importantes quando foram selecionados tendo como base o Manual NAGEH(1).

Esses dados se assemelham aos de outros estudos. Em um deles, enfermeiros de hospital público consideraram os três indicadores como muito pertinentes para qualificar a assistência de enfermagem(7). Em outro, desenvolvido em um hospital do interior de São Paulo, enfermeiros citaram, entre outros, a prevenção de quedas e o cuidado com flebites como indicadores de alta relevância para avaliação do cuidado de enfermagem(9).

As quedas são definidas como um deslocamento inadvertido do corpo ao solo ou nível inferior, resultando ou não em dano e cuja causa é multifatorial(15). Em se tratando de pacientes hospitalizados, a incidência de queda se associa sobremaneira a fatores intrínsecos - relacionados ao paciente, ao ambiente hospitalar e ao processo de trabalho dos profissionais da saúde, em especial à enfermagem (extrínsecos). No que tange aos fatores extrínsecos relativos à enfermagem, aponta-se como fator crítico a ausência ou inconformidade no registro da avaliação do paciente, especialmente no que concerne à sua mobilidade e sensório, as quais podem ser descritas de diversas maneiras e, por esse motivo, mal interpretadas(16).

Quando os profissionais de enfermagem avaliam o paciente ou realizam ações de saúde, mas não as registra, obsta uma assistência de qualidade e impede a apreensão de dados por outros profissionais para subsidiar o planejamento de ações a serem desenvolvidas junto à clientela(17).

As lesões por pressão são injúrias de pele e/ou tecidos subjacentes, que resultam da pressão ou combinação dela com forças de cisalhamento. Localizam-se normalmente sobre proeminências ósseas, como o sacro e calcâneo(18). Estas afecções refletem de forma direta a qualidade do cuidado prestado pela enfermagem, posto que sua prevenção admite participação fundamental do enfermeiro na manutenção da integridade da pele dos pacientes sob seu cuidado, frente a fatores de risco identificáveis, como limitação ao leito e dependência física. Assim, o uso desse indicador requer observação atentiva e constante para a identificação das áreas e pacientes com maior risco de desenvolvimento de lesões(13).

A punção de vasos está entre as inúmeras atividades executadas cotidianamente pelos enfermeiros no âmbito hospitalar. Trata-se de uma técnica invasiva que exige conhecimentos específicos e habilidades manuais para a sua execução e imprime cuidados e monitoramento constante para prevenção da flebite, principal complicação associada ao uso de cateteres venosos e que consiste em inflamação do vaso sanguíneo(8).

Em serviços hospitalares, a flebite mostra-se como um evento adverso de elevada incidência, e tem potencial para causar elevação de custos, prolongamento da internação, e complicações clínicas graves ao paciente, como a septicemia. Assim, com vistas à segurança do paciente e qualidade assistencial, o enfermeiro deve buscar monitorar os índices de flebite, instituindo medidas corretivas e de prevenção(19).

Observa-se que os principais indicadores tomados como prioritários pelos enfermeiros do presente estudo denotam grande valorização dos processos assistenciais peculiares à enfermagem, os quais estão estreitamente vinculados às ações cotidianas da enfermagem e são, portanto, elegíveis para avaliação da qualidade da assistência(7).

Considerando o exposto, os processos avaliativos não podem estar desconexos dos processos de educação permanente dos profissionais, já que a literatura descreve que os comportamentos clínicos indesejáveis persistem quando não se empregam medidas educativas, e que a utilização de indicadores pelos enfermeiros ainda é incipiente. Nesse aspecto, os indicadores de monitoramento da qualidade pode motivar os enfermeiros a mudar práticas inseguras e a qualificar os cuidados prestados(20).

CONCLUSÃO

A necessidade de se ter parâmetros objetivos para avaliar a qualidade da assistência de enfermagem se constituiu na mola propulsora para o movimento de reflexão inserido neste estudo que, nesta perspectiva, objetivou identificar indicadores que pudessem ser mensurados e controlados por enfermeiros no âmbito hospitalar, e que refletissem a realidade do cuidado prestado por esses profissionais.

Os enfermeiros deste estudo indicaram três indicadores prioritários para aferir a qualidade assistencial: incidência de lesão por pressão, incidência de queda e incidência de flebite. A importância desses indicadores, que também estão indicados no Manual NAGEH, se ancora nas possibilidades de prevenção desses eventos, por meio de uma atuação profissional atenta, a despeito dos inúmeros fatores que podem contribuir para a ineficiência da assistência de enfermagem, como estrutura física, reduzido número de profissionais e sobrecarga de trabalho.

A avaliação dos fatores de riscos que podem desencadear a lesão por pressão, a queda e a flebite está no âmbito de atuação do enfermeiro, o qual pode desenvolver estratégias preventivas que se alicerçam em protocolos de enfermagem, como a mudança de decúbito, a avaliação e troca de dispositivos de acesso vascular. A execução criteriosa de técnicas respeitando os preceitos assépticos se tornam relevantes no desenvolvimento do cuidado de enfermagem.

Almeja-se que este estudo contribua para exploração do conhecimento sobre indicadores, enseje a busca pela excelência profissional da enfermagem no cenário, desencadeie processos de educação permanente e tomada de decisão gerencial, no sentido de melhorar a qualidade da assistência e a garantir a segurança do paciente.

Ressalta-se que os resultados desta pesquisa foram utilizados para confecção de um protótipo de ferramenta computacional para cálculo de indicadores de qualidade, que será objeto de estudo de outro manuscrito.

Em que pese à limitação deste estudo de ter sido desenvolvido em âmbito local, não permitindo a generalização dos resultados, espera-se que ele subsidie outros estudos nacionais, na perspectiva de uma avaliação que considere a realidade e a cultura institucional dos serviços de saúde.


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Todos os autores participaram das fases dessa publicação em uma ou mais etapas a seguir, de acordo com as recomendações do International Committe of Medical Journal Editors (ICMJE, 2013): (a) participação substancial na concepção ou confecção do manuscrito ou da coleta, análise ou interpretação dos dados; (b) elaboração do trabalho ou realização de revisão crítica do conteúdo intelectual; (c) aprovação da versão submetida. Todos os autores declaram para os devidos fins que são de suas responsabilidades o conteúdo relacionado a todos os aspectos do manuscrito submetido ao OBJN. Garantem que as questões relacionadas com a exatidão ou integridade de qualquer parte do artigo foram devidamente investigadas e resolvidas. Eximindo, portanto o OBJN de qualquer participação solidária em eventuais imbróglios sobre a materia em apreço. Todos os autores declaram que não possuem conflito de interesses, seja de ordem financeira ou de relacionamento, que influencie a redação e/ou interpretação dos achados. Essa declaração foi assinada digitalmente por todos os autores conforme recomendação do ICMJE, cujo modelo está disponível em http://www.objnursing.uff.br/normas/DUDE_final_13-06-2013.pdf

Recebido: 07/03/2016 Revisado: 31/01/2017 Aprovado: 06/02/2017