Being human with yourself and the others in nursing: an essay

Ser gente consigo e com o outro no trabalho da enfermagem: um ensaio

 Maria de Lourdes de Souza1, Marta Lenise do Prado2, Marisa Monticelli3, Vera Radünz3,

Telma Elisa Carraro3

 1 Professora do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Coordenadora Geral da REPENSUL, SC, Brasil. 2 Coordenadora e Professora do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC, SC, Brasil. 3 Professora do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC, SC, Brasil.

 Abstract:  The subject  to be human with yourself and the others in nursing emerges from the daily activities of the nursing. It involves various interlocutors, such as, the user of the service, family, living net and the members of the health team. The objective is to point out the necessity of to be human with yourself and the others in nursing to the nurses and nursing students. This essay is a result of the reflections arising in the Care and Comfort Research Group on the Nursing Graduate Program, Federal University of Santa Catarina, Brazil. Some of the ideas are based on a non-systematic bibliographical study. The development of the reflections required time to recognize in practical some components of this assay. The tactical patience showed to be fundamental to conquer the necessary changes in terms of investment of to be human with yourself and the others in nursing. Patience is defined here as the capacity to invest energy and to reach success, against all the apparent adversities; to light and to live the fire of passion; to create opportunities for the distinct workers of the nursing, by observing the talents and the different ways to contribute for the healthful working environment. We conclude that to be human with yourself and the others in nursing is a continuous transformation because the talents are revealed as part of a synergistic effect which increases engagement in creative processes and results and it is capable of surprising the most ardent skeptics and to assume an enterprising attitude of this bigger issue - that to be human with yourself and the others in nursing in the accomplishment of the nursing working. 

Keywords: Human development; Human resources; Nursing care. 

Resumo: O tema ser gente consigo para ser com o outro, emerge nas atividades diárias da enfermagem, haja vista que trabalha com vários interlocutores, o usuário do serviço, família, rede de convivência e os integrantes da equipe de saúde. Tem como objetivo ressaltar aos enfermeiros e estudantes de enfermagem a necessidade de ser gente consigo para ser com o outro. Este ensaio decorre das reflexões realizadas no Núcleo de Pesquisa Cuidando e Confortando, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina e algumas idéias são apoiadas em estudo bibliográfico não sistemático. O desenvolvimento das reflexões requereu tempo para reconhecer na prática alguns componentes deste ensaio. A paciência tática revelou-se como fundamental para conquistar as mudanças necessárias em termos de investimento para estar bem consigo e com os outros. Paciência é definida aqui como sendo a capacidade de investir energia e ter êxito, apesar de todas as adversidades aparentes; acender e viver o fogo da paixão; criar oportunidades para os distintos trabalhadores da enfermagem, observando os talentos e os diferentes modos de contribuir para o ambiente de trabalho saudável.  Concluímos que ser gente consigo para ser com o outro é uma transformação contínua porque os talentos se revelam na convivência e têm efeito sinérgico, e este se potencializa em processos e resultados criativos capazes de surpreender os críticos mais pessimistas e assumir uma atitude empreendedora deste negócio maior - que é ser gente consigo para ser com o outro na realização do trabalho da enfermagem. 

Descritores: Desenvolvimento humano; Recursos humanos; Cuidado de enfermagem. 

Introdução

As novas maneiras de trabalhar e de aprender estão sendo elaboradas na Enfermagem por meio daqueles que crêem que o potencial humano se efetiva a partir da convivência harmônica das pessoas consigo mesmas e com seus semelhantes.

O ser consigo para ser com o outro é um processo que se desenvolve associando-se à paciência tática e a sistematização das estratégias para promover as mudanças necessárias e oportunas vão sendo articuladas nos encontros de vários interlocutores, na própria enfermagem, com os cidadãos com os quais realiza o cuidado e com as diferentes práticas sociais.(1) Paciência é definida aqui como sendo a capacidade de investir energia e ter êxito, apesar de todas as adversidades aparentes; acender e viver o fogo da paixão; criar oportunidades para os distintos trabalhadores da enfermagem e instituições; sorrir com alegria como criança; valorizar amigos e estar com eles para celebrar a vida; encarar problemas como oportunidades para ampliar a capacidade criativa e decisória; compartilhar tanto o sucesso pessoal quanto o dos outros; compreender a Enfermagem como ciência, arte e importante componente no mundo de negócios; enfim, como um oceano de oportunidades de ser consigo e com os outros. Fênix da nova era.

A paciência tática nasce e cresce em cada situação, planejada ou inesperada, e esta, por sua vez, se modifica em cada encontro ou desencontro, pessoal e profissional. O processo de tornar-se gente revela-se e se desenvolve como sendo um empreendimento fantástico.

A paciência tática é necessária para que os diferentes talentos se manifestem e sejam articulados em uma aliança próspera, a exemplo de uma rede, apesar de as análises sobre a Enfermagem sugerirem falta de autonomia, de reconhecimento, baixos salários, negarem ou não reconhecerem a real importância da profissão, apesar do que ela representa no contexto dos serviços de saúde. Além disso, a migração profissional ocorre, seja para outros países, campos de trabalho e até mesmo outras profissões, demonstrando a falta de uma política adequada de formação de recursos humanos e do exercício profissional da enfermagem. Há, sim, falta de reconhecimento e emprego, mas isto não significa falta de trabalho e pode gerar desespero, paixão, criatividade, liberdade, dor, sofrimento mental, novas competências. É nas situações de crise que as pessoas se revelam e demonstram novos modos de fazer acontecer a Enfermagem.

As contribuições a seguir são resultantes da prática no contexto da saúde e da doença; da educação e do trabalho como enfermeiras que refletem sobre a formação dos recursos humanos na saúde, priorizando o olhar sobre a Enfermagem. Assume-se como premissa que o sucesso está ao alcance de todos e que a vida é um grande laboratório produtor de alegrias e realizações, mas sobre o amanhã não há controle total. 

Objetivo

Ressaltar aos enfermeiros e estudantes de enfermagem a necessidade de ser gente consigo para ser  com o outro no trabalho da Enfermagem. 

Material e método

O ensaio foi desenvolvido a partir de reflexões sobre o cuidado humano, realizadas no Núcleo de Pesquisa Cuidando e Confortando, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e o aproximamos de alguns estudos selecionados de maneira assistemática. A reflexão, realizada a partir da própria prática de cuidado desenvolvida e estimulada no Núcleo, pensamos que devesse ser difundida como contribuições para a arte e a ciência do pensar e fazer enfermagem. Mas não se tratava de uma pesquisa, de um estudo sistemático e, por isto mesmo o classificamos, em termos metodológicos, como um ensaio. Ensaio porque não definimos um método e uma teoria para segui-los, pois o desenvolvemos de modo livre, embora buscássemos focá-lo na realidade, de modo que os enfermeiros e estudantes de enfermagem pudessem compreendê-lo à luz da própria prática consigo e com o outro. Para sustentar a idéia da livre criação, embora emergente de reflexões no contexto de um núcleo de pesquisa, registramos a seguir o que, de certo modo, norteia a liberdade metodológica que seguimos. O termo ensaio significa: “Estudo sobre determinado assunto, porém menos aprofundado e/ou menor que um tratado formal e acabado”.(2:659) Ensaio é:

[...] um gênero de composição literária sobre assunto específico, geralmente escrito em prosa. No entanto, o poeta inglês Alexander Poper escreveu ensaios em versos. O ensaio tem caráter não sistemático e experimental e o próprio termo ensaio significa tentativa. É habitualmente menos extenso e formal do que um tratado ou uma tese. Quase sempre escrito em estilo pessoal, às vezes poético ou até mesmo coloquial, o ensaio pode abordar assuntos literários, históricos, filosóficos, religiosos ou científicos, entre vários outros. O termo ensaio, com o sentido que atualmente tem, foi usado pela primeira vez em 1580, pelo francês Michel de Montaigne, que é considerado, com os seus Ensaios, o criador do gênero. Os ensaios de Montaigne são curtos, subjetivos e informais. Pouco tempo depois, em 1857, surgiam na Inglaterra os Ensaios de Francis Bacon. Ao contrário dos de Montaigne, os ensaios de Bacon são longos, objetivos e formais. Esses dois tipos de ensaios deram origem a duas grandes tendências da elaboração de ensaios. Na literatura brasileira do séc. XX, podem ser citados como grandes ensaístas, entre outros, Augusto Meyer, Mário de Andrade e Alceu Amoroso Lima.(3:304)

 

O ensaio desenvolvido tem como tema o cuidar de si para cuidar do outro como um compromisso com o próprio vir a ser da pessoa e do profissional, no exercício da enfermagem enquanto ciência e arte. 

Reflexões sobre o ser gente consigo para ser com o outro

O trabalho de tornar-se gente requer coragem para fazer-se agente da própria transformação – construir-se, estar no tempo e no espaço, considerar-se e ser o empreendedor de si como o negócio mais valioso. Este é um trabalho que vale a pena empreender, pois enquanto durar a vida haverá um círculo contínuo de todas as emoções possíveis.

Ressaltamos que trabalhar não é exclusivamente transformar um objeto ou situação em outra coisa; é também transformar a si mesmo no e pelo trabalho.(4)

O tornar-se gente por meio do trabalho é uma transformação contínua porque os talentos se revelam na convivência com um efeito sinérgico, e este se potencializa em processos e resultados criativos capazes de surpreender os críticos mais pessimistas. Durante a Guerra da Criméia, Florence Nigthingale surpreendeu às autoridades com o sentido prático de resolução de problemas dos soldados, acrescido da proteção dos direitos das famílias dos combatentes e, ainda contribuindo para a redução da infecção nos feridos na guerra.

Lembremo-nos de que, do nascimento até a morte, a competência para vir a ser gente se desenvolve em nós. Durante a infância, somos mobilizados desde os primeiros dias de escola para conviver com a curiosidade, com a descoberta de possibilidades, de amizades, de valores, de saberes e de outras potencialidades que nos tornam seres que chegam ao mundo do trabalho dos modos mais diferentes e ilógicos possíveis. Essas muitas diferenças certamente apontam para um ensinamento: – para ser gente é preciso aprender a conviver com diferenças e, antes de tudo, reconhecê-las, aceitá-las, valorizá-las e não se perder no contexto de suas próprias experimentações. As dificuldades se constituem em oportunidades para a auto-superação, para a busca de alianças, para a agregação de valores e para a diversificação do fazer enfermagem sem perder de vista o seu compromisso histórico com o ser gente.

É o desenvolvimento da compreensão do modo de viver, dos valores e daquilo que estes contribuem para saber ser e viver no mundo de relações, dos negócios, do trabalho e até do ócio.(5)

A partir daí, há que praticar o gostar de si mesmo, a verdadeira auto-estima e o respeito pelo corpo que carrega sonhos e fantasias, além de experimentar o lúdico, de aprender a rir e a tirar lições dos insucessos. A descoberta do corpo implica em admirá-lo e respeitá-lo por tudo que ele oferece, seja como suporte ao trabalho ou como fonte de prazer.

Assim, cabe a cada um de nós investir em si próprio como Ser e em seu corpo, como um Templo de mistérios; uma escola que disponibiliza teorias e práticas riquíssimas, de novas hipóteses, de maneiras de pensar, que permitam sentir e viver a aprendizagem a partir de si, e assumir uma atitude empreendedora deste negócio maior - que é ser gente consigo para ser com o outro na realização do trabalho da enfermagem, na assistência, na educação, na pesquisa e na gestão do cuidado.

Nesse aprendizado, uma das mais duras lições é a avaliação diária de si mesmo, de seus feitos e de suas omissões, das oportunidades e do exercitar-se no sorrir muito. Mas, se acontecer outra emoção, não a reprima. É fundamental que nas atividades diárias e no conviver, não sejamos econômicos com sorrisos. Particularmente, quando estivermos a sós. Lembremo-nos que “tudo vale a pena quando a alma não é pequena”.(6)

Mas, há momentos nos quais pensamos que falta de autonomia, de reconhecimento, baixos salários, falta de valorização da profissão sejam condições específicas da enfermagem, e assim acreditando, muitos enfermeiros migram para outras profissões. Estes momentos podem ser superados pelo desejo de aprender, de ultrapassar os próprios limites e de demonstrar que ser empreendedor não é ser irresponsável, não é se entregar à tortura do insucesso ou segurar o sucesso como se somente você tivesse direito a ele. É, sim, acreditar e promover talentos diferentes, saber que os riscos devem ser calculados, inclusive com margens de erro, com o assumir compromisso com a resolução do problema e não com o problema em si. É saber celebrar as possibilidades de ser sucesso, aquele sucesso que renasce dentro da pessoa e se transforma em compromisso com o coletivo, o ser gente consigo para ser com o outro.

É certo que o investimento em si representa uma árdua e complexa tarefa. Afinal, são múltiplos os sistemas, órgãos e funções que precisam ser estimulados, protegidos, nutridos, higienizados e, inclusive, tratados quando acometidos de intercorrências. Mas numa empresa também é preciso mobilizar o mercado; criar e inovar produtos e processos; valorizar, promover um ambiente de trabalho saudável e reconhecer as pessoas como um patrimônio social diante das mais diversas culturas, crenças, valores e oportunidades.

Investir no corpo que se recebeu por "herança familiar", "milagre da natureza", "dádiva de Deus" é uma atitude empreendedora. Isto requer conhecer a história eugênica da própria família para poder, então, trabalhar em si mesmo, suas fortalezas e debilidades, desenvolver uma atitude pró-ativa em defesa de si e do direito de estar bem, tanto consigo quanto com os outros.

É necessário ser empreendedor no que se refere à saúde do trabalho, colaborando na formação de ambientes de trabalho que revelem e promovam o ser gente em cada um dos participantes. O ambiente saudável mobiliza um comportamento preventivo, no mínimo para prevenir o stress, o consumo excessivo do álcool, o uso de outras drogas ilícitas, as doenças mais prevalentes, as perdas precoces das condições favoráveis ao bem viver, assim como a promoção da própria saúde.(7, 8)

No trabalho da Enfermagem há pessoas que têm mais de um emprego e isto favorece a fadiga, com a falta de tempo para a prática de atividades física redutora de estresse.(9-11) Assim, o compromisso com múltiplos trabalhos leva as pessoas a adoecer e, também, a apresentar os sete pecados capitais, com destaque para a inveja, fragilizando a si mesmos e o coletivo.

Cabe então a formação de recursos humanos para a cultura de trabalho onde seja reconhecido que todos têm fortalezas e debilidades e de que no firmamento há lugar para todas as estrelas. Reconhecer que as fragilidades podem ser transformadas em fortalezas, dependendo do local e das condições de trabalho em que se inserir, com o suporte das parcerias que a enfermagem estabelecer.

O trabalho de fortalecimento do talento das pessoas representa a vivência que busca o desenvolvimento da competência para saber ser e trabalhar como gente. A competência para relacionar-se com os demais integrantes da equipe de enfermagem, de outras práticas profissionais e, com os cidadãos que compartilham o cuidado de enfermagem.(12)

É interessante destacar que à medida que os trabalhadores se acostumam a se ver, a olhar e ver seu próprio corpo, a auscultar seus interesses, sua história pessoal, seus modos de relacionar-se, obtém subsídios para compreender e se aproximar do desenvolvimento de uma visão do mercado. E esta visão os ajudará a pensar também em si a partir de sua própria inserção no mundo dos negócios, do trabalho, observando, descobrindo e conquistando novas oportunidades.(13)

A atenção ao mercado e a tudo que nele eclode tende a modificar duas leis naturais que afetam a vida das pessoas: a lei da inércia e a lei do menor esforço.

O ser humano realiza mudanças, move-se em espaços e tempos distintos, ou seja, migra e desenvolve novas competências para o trabalho e, por conseguinte, novas maneiras de aprender e de viver, inclusive as de trabalhar. O ser humano cria possibilidades para aplicar o que sabe em novos tempos e espaços; aprende que tempos e espaços são mutáveis; recria e inova os modos de aprender e trabalhar; muda de ramo de atividade e de maneiras de nele trabalhar; desenvolve competências para conviver com a incerteza; agrega valores para a futuridade e para o redesenho do presente; busca sua inserção em construções coletivas.

Aplicar o que sabe em tempos e espaços diferentes é uma nova modalidade de trabalhar a si mesmo. Com o decorrer do tempo se aprende a ser e trabalhar de uma determinada maneira, mas ao longo da vida, e desde seu começo, o Ser se movimenta, sai da latência; modifica a si e o cenário em que vive e trabalha. Isto se respalda no pressuposto de que o ser humano não está em relação com o mundo somente por meio do pensamento, mas também modifica o mundo por meio de sua ação.(14)

O ser gente no trabalho desenvolve a aprendizagem no próprio trabalho pela tradição ou pela educação formal e muitas vezes há um desencontro entre o saber transmitido pela tradição e o saber que é ensinado em instituições de ensino. A superação deste desencontro tem sido promovida por meio de várias estratégias como a realização de oficinas de idéias e o desenvolvimento de dissertações e teses de pós-graduação pactuadas com empresas e serviços.

São incríveis as oportunidades para o ser gente no trabalho e estas estão a desafiar a criatividade humana. Essa criatividade mesma que se apresenta na criança como uma das características do seu desenvolvimento e que a leva a incontáveis por quês.

As várias perguntas sem respostas é que fazem à cabeça florescer na inquietante busca de novos modos de ser no trabalho.

Como está à competência da enfermagem para aprender a aprender sobre o ser gente no trabalho, sobre o valor do seu trabalho, ser pesquisador, ser educador sem perder de vista o ethos da profissão? Será que os enfermeiros estão criando oportunidades para superar a si mesmos? Têm um plano ou contrato consigo mesmo, com metas e táticas definidas, com um bom plano de desenvolvimento de talento? Analisam o mercado, as políticas e discutem a futuridade da profissão? Reconhecem talentos complementares e fazem parcerias, cursos, estágios, intercâmbios, publicações – que representa o próprio investimento no capital intelectual? Como é o investimento na própria saúde, para ser saudável e poder ser com o outro no cuidado de enfermagem? Estas são perguntas de ordem prática que cada um, a seu tempo e de acordo com seu modo pessoal, pode criar e implementar, tornando-se um Ser mais pró-ativo na caminhada do ser gente consigo  para ser com o outro.

É deste modo, ainda, que se deixa de conceber e praticar a solidariedade na forma trivial e prosaica que evoca um vago sentimento de pertencimento a um grupo socialmente coeso, uma prontidão para ajudar em casos catastróficos e/ou associa-se, tênue e esporadicamente, com a responsabilidade social.(15) Também é necessário admitir que há diferentes dons em cada criatura e que uma delas só não contém todos os dons.(16) Portanto, é pela interação dos diferentes dons ou talentos e pela sinergia entre as pessoas e suas atividades que resulta a potenciação do trabalho, do aprender e de inovar.

As oportunidades são múltiplas e algumas, inesperadas, e podem potencializar talentos, desde que o sujeito não se enclausure em um único e específico trabalho e se limite a um único conhecimento. É necessário ser como um caleidoscópio, um imaginário de imagens, sonhos e projetos; sempre em movimento, buscando Ser e respeitando os demais companheiros de caminhada e de aprendizagem. Isto requer aprender a pensar e a agir de maneira criativa, a compartilhar conhecimentos e oportunidades, ser ético consigo e com os demais viventes e com o ambiente e descobrir prazer no que faz.

Trabalhar para ser gente consigo e para ser com o outro, no contexto do trabalho, é sentir a vida construindo-se e perdendo-se; é encontrar significado na existência humana, mesmo diante da dor, da fome, da doença, da alegria e da esperança. É ser e estar no mundo como ele se nos apresenta e não como o fantasiamos, mas como contribuímos para que ele seja melhor.

Afinal, ser gente consigo para ser com o outro no contexto do trabalho e, particularmente, no cuidado de enfermagem, é preciso compreender que: “[...] o mundo é seu também, que o seu trabalho não é a pena que paga por ser homem, mas um modo de amar - e de ajudar o mundo a ser melhor”.(17:30) 

Considerações finais

É fundamental investir em si próprio como Ser e em seu corpo, como um Templo de mistérios; uma escola que disponibiliza teorias e práticas riquíssimas, de novas hipóteses, de maneiras de pensar, que permitam sentir e viver a aprendizagem a partir de si. Isto requer assumir uma atitude empreendedora deste negócio maior - que é ser gente consigo para ser com o outro na realização do trabalho da enfermagem. Implica em promover talentos diferentes, assumir compromisso com a resolução do problema e não com o problema em si, celebrar as possibilidades de ser sucesso, aquele sucesso que renasce dentro da pessoa e se transforma em compromisso com o coletivo. Requer ainda, conhecer a história da própria família para poder, então, trabalhar em si mesmo, suas fortalezas e debilidades, desenvolver uma atitude pró-ativa em defesa de si e do direito de estar bem, tanto consigo quanto com os outros. Enfim, sem a pretensão de ter apontado todas as nuances deste conteúdo, é necessário ser empreendedor no que se refere à saúde do trabalho, colaborando na formação de ambientes saudáveis que revelem e promovam o ser gente em cada um dos participantes com as suas diferenças que fazem a arte e a ciência da Enfermagem.  

Referências

1. Souza ML, Prado ML. Potencia de las redes para el desarrollo de la investigación en enfermería: la experiencia del REPENSUL (Brasil). In: Anais do IX Coloquio Panamericano de Investigación en Enfermería; 2004 nov 01-03; Lima (Perú): OMS/OPS; 2004. [CD-ROM].

2. Ferreira ABH. Novo dicionário Aurélio Larousse Ática: Dicionário da língua portuguesa. 5. ed. São Paulo (SP): Atica; 2001. Ensaio2; p. 659.

3. Sartor VVB, Cruz Jr JB, Souza ML. Relatório da cátedra globalização e humanismo na administração da saúde pública. Projeto Humanismo Latino. Florianópolis (SC): Fondazzione Cassamarca; 2002.  (Relatório técnico).

4. Tardif M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis (RJ): Vozes; 2002.

5. Souza ML, Sartor VVB, Prado ML. Subsídios para uma ética da responsabilidade em Enfermagem. Texto Contexto Enferm. 2005 Jan.-Mar;14(1):75-81.

6. Pessoa F. Mar Portuguez. In: Obra Poética. Rio de Janeiro (RJ): Nova Aguilar; 1995.

7. Heidemann ITSB, Almeida MCP, Boehs AE, Wosny AM, Monticelli M. Promoção a Saúde: trajetória histórica de suas concepções. Texto Contexto Enferm. 2006 Abr. Jun;15(2):352.

8. Radünz V. Uma filosofia para enfermeiros: o cuidar de si, a convivência com a finitude e a evitabilidade do burnout [tese]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina. Programa de Pós-Graduação em Enfermagem; 1999.

9. Lopes MJM. O trabalho da enfermeira: nem público, nem privado - feminino, doméstico e desvalorizado. Rev Bras Enfer. 1998 jul-dez;41(3/4):211-217.

10. Breilh J. Economia, política e saúde. São Paulo (SP): HUCITEC; 1991.

11. Oguisso T. A mulher na força de trabalho: o trabalho da mulher enfermeira. Rev Enfermagem Uerj. 1998;6(1):309-16.

12. Cestari ME. Nursing knowledge patterns in textual academic production - documental analyses. Online Braz J Nurs [online]. 2005[Citado em 28 Dez 2006];4(3):[6 fls.]. Disponível em: http://www.uff.br/objnursing/viewarticle.php?id=32&layout=html.

13. Reibnitz KS, Prado ML. Inovação e educação em enfermagem. Florianópolis: Cidade Futura; 2006.

14. Morra G. Filosofia para todos. São Paulo (SP): Paulus; 2001.

15. Cruz Jr JB, Sartor VVB, Souza ML. Solidariedade, humanismo e saúde pública. In: Bombassaro LC, Dal Ri Jr A, Paviani J. As interfaces do Humanismo Latino. Porto Alegre: EDIPUCRS; 2004.

16. Bíblia Sagrada. 3. ed. São Paulo (SP): Edições Paulinas, 2000. Atos dos Apóstolos, Primeira Epístola aos Coríntios, 1:12.

17. Mello T. Faz escuro mais eu canto. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira; 1976

 Received May 31, 2007
Revised Jun 25, 2007
Accept July 18, 2007